De Canção em Canção (Song to Song)
Desde 2012 escuto falar desse filme e o aguardo com certa ansiedade. Até muito pouco tempo atrás, no imdb seu nome constava como “projeto sem título”. Recentemente, foi lançado como De Canção em Canção. Apesar de ser regido por Terrence Malick e ter em seu elenco nomes como Ryan Gosling, Michael Fassbender, Rooney Mara, Natalie Portman, Cate Blanchett e Val Kilmer (esses dois, em passagem muito breve), além da cinematografia ser assinada pelo inigualável Emmanuel Lubezki, no Rio de Janeiro nem mesmo os cinemas alternativos reservaram uma sala completa para a obra. Pouquíssimos horários em todo o estado já dão o tom pouco apelativo para o público em geral.
A história narrada é simples e sem rodeios: uma história de amor. Iniciada pelo triangulo BV, Cook e Faye (respectivamente interpretados por Gosling, Fassbender e Mara, cujas atuações dispensam – e sempre dispensarão – comentários), a trama tem como plano de fundo o universo musical, no qual Cook tem concreta influência (inclusive, partes foram filmadas durante um festival em Austin, Texas). BV e Faye, que se conhecem neste meio, tentam seu espaço no mundo da música e vêem no grande produtor Cook a possibilidade para isso. A narrativa que se segue é a apresentação pouco trivial dos conflitos amorosos e profissionais desses três personagens.
Este filme contém a assinatura usual de Malick: há quebras narrativas, imagens belíssimas e extremamente contemplativas e estrutura de roteiro e montagem que não assumem o pacto tradicional do Cinema. Vamos conhecendo os personagens ao longo de toda a história. Até próximo da conclusão do filme, ainda estamos em contato com novos elementos que constroem a personalidade de cada um: desejos, medos, problemas e relações. Surgindo como fragmentos da vida de cada qual, como se jogados em um tornado e encontrados fora de ordem por um espectador isento qualquer, as passagens de cada protagonista são costuradas lado a lado, tendo como linha condutora o amor e a sua expressão pessoal.
Contrastes saltam à tela. Não apenas contrastes de imagens, mas de caráter; de personagens. Cook, o produtor, é aquela pessoa com complexo de semi-deus, que acha que tudo pode, pois todas as coisas costumam tombar em reverência ao seu sucesso. Egoísta, hedonista, o autodeclarado “rei” tenta controlar tudo à sua volta, de acordo com o que é mais conveniente para si próprio. “Ele muda tudo o que se aproxima dele”, acerta Faye, durante uma de suas contínuas reflexões. Ela e BV, quase que em oposição a esta figura demasiado carnal e mundana, notam que na vida a única coisa que importa são os sentimentos puros e sinceros, os quais se resumem a uma palavra divina: o amor.
Filmado em alguns momentos com uma GoPro (apesar de parecer que constantemente esta câmera fora utilizada), o efeito é uma proximidade muito maior dos personagens. Como se aquilo, de fato, tivesse sido documentado; como se fôssemos mais do que espectadores de um filme, mas sombras de seus destinos. Assemelhamo-nos a esta linha que vai juntando as partículas de vida dessas pessoas fragmentadas, nas mãos do tecelão Terrence. Se a narrativa pouco usual seria uma quebra para a imediata relação com os personagens, o sentimento que eles buscam é o que nos mantém cada vez mais próximos destes protagonistas. Quando falo que é um filme sobre amor, não quero dizer que seja tão somente sobre a relação de pessoas que se desejam, mas sobre a pureza e sinceridade deste divino sentimento.
E, neste sentido específico, “qualquer experiência é melhor do que nenhuma experiência”.
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