O Castelo de Vidro (The Glass Castle)

Nós não escolhemos nossos pais, não escolhemos nascer. O fim da era de ouro do útero lateja em alguns corações até hoje, porque após a quebra do saudoso cordão umbilical somos apresentados a um mundo que ainda não é nosso, maculado com os pecados de ancestrais distantes e carregando as mágoas e desejos da geração que empurra nossos carinhos de bebê.

Somos filhos dos nossos pais e não há muito o que fazer. Podemos ser reativos ou simplesmente vender nosso mundo e nos tornarmos ambulantes pastiches genéticas.

O Castelo de Vidro é um dilacerante drama sobre o impacto da convenção social familiar. Em seus melhores momentos é de uma melancolia ostensiva, transparecendo silhuetas mórbidas que se arrastam procurando por sonhos que não podem e não poderão alcançar, não por problemas internos, mas sim por sequelas deixadas por papai e mamãe.

Tratando de uma família de 4 filhos, um pai engenheiro e uma mãe representando em suas telas o expressionismo abstrato, o roteiro inspirado no best seller homônimo consegue reproduzir os dilemas e conflitos de qualquer lar. Porém, os Walls estão longe da normalidade de pizza no domingo e jogos de futebol aos sábados, vivem de abrigo em abrigo, fugindo da opressão capitalista e em busca da utopia de seu patriarca, o tal castelo de vidro.

Produzindo lágrimas a cada frame, a obra procura entre os desertos e a libertinagem ianque uma identidade própria, americana, de homens e mulheres à margem, nascidos dos expurgos do Mayflower para mudar o mundo. Entretanto, o longa foge de qualquer panfletarismo, expondo no pai de família de lábia afiada toda a frustração de quem promete tudo e se afoga na garrafa.

E teria tudo para se tornar o drama familiar desse tempo, pelo bem escrito roteiro, as cenas marcantes e atuação soberba de Woody Harrelson, em um dos melhores momentos de sua carreira. Brie Larson é protocolar e Naomi Watts acompanha sem maiores problemas. Todavia, se as atuações estão afiadas e o relato geracional se prova emocionante, o problema recai numa direção paupérrima, fotografia incapaz de aproveitar os belos cenários e uma direção de arte opaca.

No fim, a obra se prova tocante e poderosa ao expor os cacos tão transparentes quanto fracos dessa convenção moderna de vidro. Sobrevivendo a sua falta de esmero técnico, o filme prova ser possível sobreviver até a pior e mais memorável das famílias.

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