Planeta dos Macacos: A Guerra (War for the Planet of the Apes)
Eu sou em geral bem contra remakes, reboots e afins. Via de regra, a versão nova é pior que a antiga, perde a alma que fez o sucesso original e é feita com uma intenção puramente comercial, na tentativa de ocidentalizar e/ou atualizar o que se entende por uma fórmula de sucesso no afã de se faturar milhões em cima disso.
Apesar das intenções comerciais serem evidentes nessa nova versão de Planeta dos Macacos, é inegável que os produtores resolveram se esforçar para entregar um entretenimento inteligente, voltado para o público pensante, ao mesmo tempo em que muita coisa explode e muita gente morre. Nunca essa comunhão entre o entretenimento e a vontade de usar a arte como uma inteligente e necessária alegoria para os tempos foi tão clara e pertinente na série quanto é aqui.
Em 1968, quando foi lançado o primeiro filme do que hoje é uma franquia, havia também uma preocupação em chamar atenção para a intolerância racial ao inverter o papel do ser humano (o homem branco) com o macaco (a minoria em geral) na sociedade americana. Mas o que era apenas um ensaio lá atrás hoje toma contornos evidentes e impossíveis de se evitar.
Neste Planeta dos Macacos: A Guerra, a humanidade foi quase que totalmente aniquilada pelo mesmo vírus da gripe símia que deu senciência e inteligência aos macacos, conforme o que se demonstrou nos dois primeiros filmes. Caesar (Andy Serkis), o símio inteligente primordial, lidera uma tribo de macacos nas florestas do norte da Califórnia quando começam a sofrer ataques de uma espécie de enclave militar liderada pelo Coronel (Woody Harrelson), uma figura quase que messiânica para seus comandados.
Logo na cena inicial a câmera focaliza em um soldado se esgueirando pela floresta quando uma mão de macaco se aproxima por trás. Esta mão não está ali para lhe atacar, mas para lhe passar uma informação pertinente à missão. O dono da mão é um macaco que colabora com os humanos, ostentando em sua fronte uma marcação à ferro quente dos símbolos de alfa e ômega, além de uma inscrição em seu pelo que o rotula de donkey (algo como burro de carga ou jumento.) Ou seja, assim como na conquista do oeste em que alguns índios ajudavam o homem branco na caça de seu povo ou durante a 2ª Guerra quando os sonderkommandos judeus ajudavam na tarefa de se livrar dos corpos do campo de concentração, alguns indivíduos da classe oprimida sempre colaboram com seus opressores em detrimento do grupo ao qual arbitrariamente pertencem.
A analogia fica ainda mais clara quando se percebe que os homens do Coronel usam armamento moderno e pesado, enquanto que os macacos estão relegados ao uso de lanças, arcos, armadilhas e uma ou outra arma de fogo.
Todo esse comentário social, contudo, está longe de fazer com que este seja um drama denso sobre as agruras da intolerância racial. Esta ainda é uma obra feita para arrasar quarteirões e o faz de forma ao mesmo tempo inteligente e tecnicamente impecável. A tecnologia do que hoje é chamado de Performance Capture chegou a um nível tal que a atuação de Andy Serkis como o macaco Caesar é indiferenciável do que seria sua interpretação de um ser humano normal. Tanto a performance do ator quanto à excelência técnica dos artistas gráficos, passando pelo avanço da tecnologia, permitem que o ator expresse suas emoções como se não estivesse usando um macacão cheio de luzinhas e eletrodos. Os excelentes diálogos entre Caesar e o Coronel provam isso.
Dentro em muito breve precisaremos começar a falar sobre prêmios importantes para este tipo de trabalho, sendo que Andy Serkis, desde seu Gollulm na trilogia Senhor dos Anéis, é o papa nesta área e uma indicação a um Oscar pela sua interpretação de Caesar, apesar de forçada, não seria nenhum exagero.
Matt Reeves dirige um filme intenso, ainda que um tanto longo demais, demonstrando estar se tornando um cineasta nos moldes de Nolan e Spielberg ao conseguir imprimir inteligência e sua marca a uma obra criada com o objetivo inicial de fazer dinheiro, mas não que se furta em tentar passar uma mensagem. Este foi o caso com este filme e este, torçamos, será o caso com o próximo filme do Batman, dirigido e escrito por Reeves.
Seja pela forte e clara crítica social, seja pela cacetada de explosões e pelo primor técnico de cada cena, Planeta dos Macacos: A Guerra é uma excelente, pertinente e inteligente peça de entretenimento. Curiosamente, não é, ao contrário da nossa realidade e dos blockbusters em geral, só um monte de macaco fazendo macaquice.
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