Crítica: Manifesto


Antes de mais nada, quero falar sobre o roteirista, diretor e produtor do filme: Julian Rosefeldt. Esse cara é um artista alemão que é conhecido por instalações contemporâneas, onde há tanto imagem como vídeo e, em especial, projeções múltiplas. Ele também é diretor de cinema e suas produções seguem a mesma linha, pelo que pesquisei. Em Manifesto não é de se esperar diferente; o filme propõe falar de arte com roteiro quase que inteiramente feito por monólogos de manifestos de diversos pensadores. Se sua expectativa é por um filme leve, esqueça. A obra de Rosefeldt está aqui para sugar seu cérebro com canudinho e ainda deixar lacunas em branco ao final, que serão preenchidas com mais reflexão e estudo. Ufa.

O filme começa com um dos poucos manifestos que de fato li (são usados mais de 50): O Manifesto do Partido Comunista, escrito por Marx e Engels. Pescou minha atenção. Mas que será que dá um filme no qual Cate Blanchett discursa tal documento histórico? E, falando da atriz, no filme ela dá vida a 13 pessoas diferentes ao redor do globo. E de uma conhecemos apenas a voz. Eu sei que desde “Orphan Black” isso não é lá muito surpreendente, no entanto trata-se de Cate, que eu vejo no mesmo nível de Meryl Streep e Nicole Kidman enquanto artista. Esses elementos fazem que o filme seja, no mínimo, intrigante.

O primeiro personagem da atriz: um mendigo em um futuro distópico.

Como já dito, é uma obra difícil e não faz meu tipo preferido. Mas deixarei isso de lado para tentar não contaminar muito (impossível isentar-se por completo) com minhas predileções. Leva um tempo para acostumar-se ao que o filme propõe: o tal pacto que o espectador firma com o diretor para o entendimento do que lhe é exposto. Pra mim demorou quase metade do filme. Talvez isso seja um belo tapa dizendo que sou conservadora ou antiquada. Ou não. Vai saber.

Seguindo uma linha multilinear, tal qual as instalações do artista, a história se ramifica e parece, por vezes, não ter um ato final. Na verdade, descubro aos poucos que é assim mesmo que tem que ser. Cada personagem refere-se à história da arte e seus movimentos, apropriando-se de manifestos referentes à suas épocas. Passando pelo Futurismo, Expressionismo, Dadaísmo (ainda lembro desse da escola!), Surrealismo e desaguando na 7ª Arte, somos expostos à explicações e críticas e uma mistura doida de o que são os movimentos citados. Com um certo ar pretensioso, os diálogos são encaixados de maneira voraz nas situações banais e nada artísticas, como quem diz “olha como sou revolucionário”. Algumas vezes dá certo, outras me soa pedantismo.

Cate Blanchett e suas 12 personificações

A impressão que tenho do filme é que ele pegou uma atriz espetacular, que é Cate Blanchett, e se sustentou nela, de maneira apelativa. Digo isso por que é FATO que o filme não existiria na pele de nenhuma outra – talvez nem da rainha do cinema, Meryl Streep. É incrível como em 12 personagens com pouquíssimas falas próprias, ou seja, sem ser retirado de um dos manifestos, Kate nos esclarece diferenças e atua sem o menor esforço para criá-los. Acredito que o filme tenha a intenção de revolucionar pelo roteiro, mas é na atuação que ganha destaque e maior prestígio.

No mais, ainda estou em órbita com o longa e preciso de uns dias pensativos, sozinha e lendo sobre arte pra entender melhor. A priori a impressão petulante de um forçoso choque, seja pelas massivas referências culturais e acadêmicas, seja pelo ritmo conceitual e atípico, ainda está marcada em mim. Uma coisa que me incomodou e que é produto do já dito é essa sensação tão característica da minha geração pós-moderna: a de críticar tudo e não construir nada. A tal da “desconstrução” torna-se sem propósito pelo simples fazer por fazer. Argh.

Por fim, o que mais me agradou do filme inteiro foi seu ato final, onde fala do que mais gosto: o Cinema. É bem suspeito considerar este o ápice, é claro. Mas sigamos. Nele somos expostos às regras do cinema do Jarmusch e à estileira de Lars Von Trier e Thomas Vinterberg em seu Dogma 95.

Cate como “A Professora”, personagem que simboliza a criação de regras para o Cinema e descreve demais movimentos da 7ª arte

Manifesto não está aqui pra agradar e deixa isso bem claro. Tendo isso em mente, prepare-se para uma experiência sensorial que pode te deixar sem entender porra nenhuma, pode te deixar puto, pode te fazer achar a fotografia impecável ou pode fazer todo sentido do mundo. Uma coisa é certa: não é um filme em que a indiferença reinará. O que é excelente característica enquanto arte, já que se estrutura no sentir mesmo. Pretensioso ou não, conteudista ou apenas cult, respire fundo e assegure-se que o inesperado te espera.

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