Crítica: Alias Grace 1ª Temporada
Alias Grace impõe grande expectativa por carregar consigo o nome de uma brilhante escritora: Margaret Atwood. Baseada em um livro da autora, que conquistou meu enorme respeito e admiração pelo fantástico “The Handmaid’s Tale”, a série da Netflix estreia e a comparação com a série ganhadora do Emmy de 2017 é inevitável. Em “The Handmaid’s Tale” temos uma assustadora distopia americana que mistura um futurismo não tão distante com um retrocesso ao século XIX; coisa que é difícil descrever em poucas linhas e que será devidamente resenhada quando sua estreia no Brasil, prevista para 2018, ocorrer. Aguardo ansiosamente, inclusive. Diante disso, Alias Grace tem o desafio de manter o mesmo nível revolucionário e de despertar o efeito petrificante que a supracitada obra de Atwood desperta.
E agora?
Assassina. Assassina célebre é como Grace (Sarah Gadon) é conhecida. Ela é condenada pelo assassinato de seus mestres, sendo ela uma reles criada de uma família com grana no norte do Canadá. Em pleno século XIX, a imigrante irlandesa encontra na criadagem a única forma de ganhar dinheiro honestamente até que é encarcerada por mais de 10 anos – e por um crime que ainda é questionado se foi de fato de sua autoria.
Se tem uma coisa que Margaret Atwood sabe fazer com perfeição é retratar o feminino de maneira atemporal. Em Alias Grace, a personagem é uma típica mulher conservadora do século, que compactua com os valores morais da época e sofre represália ainda assim pela posição que ocupa de criminosa, de criada e de mulher, por fim. Absolutamente todos os personagens masculinos a danificam de alguma forma. Começando pelo pai, um alcoólatra abusivo; passando pelos colegas de trabalho, desrespeitosos ou até, quando mais brandos, subestimadores da pobre garota; desaguando, é claro, nos funcionários da prisão e o abuso de poder. Até mesmo o médico, em quem repousa a esperança da salvação de Grace, contratado para analisá-la e redigir o laudo capaz de libertá-la, acaba por mostrar-se um homem padrão da época.
O Dr. Simon Jordan (Edward Holcroft) chega à penitenciária vindo dos Estados Unidos e é, aparentemente ou ao menos profissionalmente, diferente dos demais médicos. Usando uma técnica que dispensa a instrumentalidade da medicina e atenta-se mais ao estudo psicológico do ser, o homem inicia uma espécie de psicanálise em Grace. Ao longo dos seis episódios seguimos a história da vida da mulher, inegavelmente atrelada ao crime. Difamada e distorcida pelos jornais e opinião pública, a versão de Grace propriamente dita foi pouco ouvida; naquelas consultas é que descobrimos com o médico o que aconteceu ou não. A não ser que Grace esteja mentindo…
Os dois estabelecem confiança e a trama ameaça de que vai resultar em um romance água com açúcar eventualmente. Eis então que, na minha opinião, a história se perde um pouco, visto que não vejo espaço pra inserir isso na narrativa. De qualquer forma, prossigamos, não tô aqui pra dar spoiler. O que importa mesmo é o clima de suspense/crime que é proposto, e este falha no audiovisual. Acredito eu que esse é o tipo de obra que funciona na linguagem literária, como tantas outras por aí; por conta do trabalho de imaginar que o livro nos dá, a trama muitas vezes se torna intrigante e desafiadora. No entanto, tendo este trabalho mastigado pela produção visual e posto em tela, espera-se mais da história para que possamos ser engajados de fato. E confesso que o ritmo e a narrativa passaram longe de me prender.
Alias Grace conta com atuações boas, mas não espetaculares, um compasso vagaroso – que é até razoavelmente compreensível visto que é uma trama “de época” na falta de melhor termo – e com uma história que deixa a desejar. Muito pela injusta expectativa de algo que exploda sua cabeça tal como acontece em “The Handmaid’s Tale”, a série me decepcionou apesar de não cometer nenhum erro absurdo com o telespectador – não fui feita de idiota em momento algum, falando a grosso modo. Só não clicou. Pra simplificar, é bem quando você conhece alguém agradável, de boa aparência e com qualidades que você almeja, mas não tem química entre vocês dois para resultar em alguma coisa. Ainda nessa alegoria, “The Handmaid’s Tale” é como se fosse aquela pessoa que você bate o olho e quer casar, ter um cachorro chamado Jorge e morar longe da sociedade em algum lugar frio. Mas deixo claro que a decepção aqui é pela série, e não pela história. Margaret Atwood continua sendo foda e merecendo pagação de pau infinita.
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