Crítica: Assassinato no Expresso do Oriente (Murder on the Orient Express)

Não fosse pela existência de Sherlock Holmes e do Scooby-Doo, Hercule Poirot seria o detetive mais famoso e cultuado da cultura popular. Mesmo estando em um nada vergonhoso segundo plano quando comparado ao seu colega criado por Sir Arthur Conan Doyle, o detetive apologeticamente belga criado pela agora legendária Agatha Christie não deixa em absolutamente nada a desejar no que se refere aos seus poderes quase sobrenaturais de dedução, além de ostentar um bigode muito mais suntuoso do que qualquer chapeuzinho e cachimbo jamais podem almejar a ser.

Assassinato no Expresso do Oriente se trata tão somente da mais afamada e clássica aventura deste personagem que protagoniza 33 dos incontáveis romances detetivescos de Christie (além de uma peça e mais de 50 contos), desta vez na inspirada interpretação de Sir Kenneth Branagh, que também assina a direção do longa e ostenta o mais glorioso bigode da história desse personagem e possivelmente do cinema.

Adaptado das páginas de Christie pela enésima vez, a trama do filme não é grande novidade para ninguém. Hercule (Branagh) é obrigado de última hora a embarcar no famosíssimo Expresso do Oriente, um famoso e luxuoso trem de passageiros que fazia o trajeto Constantinopla – Calais, na França. A bordo do trem, ele conhece uma série de personagens que você vai achar que saíram daquele jogo de tabuleiro “Detetive” e você vai ter razão, já que o jogo foi muito inspirado nas aventuras de Poirot e nessa história em específico. Uma vez no trem, Ratchet (Johnny Depp), um sujeito meio vilanesco e cheio de inimigos, é assassinado.

O assassino não contava, contudo, com a presença de Hercule Poirot, seu TOC e verdadeira obsessão com a verdade. Todo o estreladíssimo elenco – que conta com Dame Judi DenchDaisy RidleyPenélope CruzJosh GadMichelle PfeifferOlivia ColmanWillem Dafoe, dentre outros – é suspeito e, como tal, será interrogado por Poirot em boa parte das quase 2 horas de exibição do filme.

Iniciando cheio de estilo em uma cena na qual Poirot, com sua perspicácia e brilhantismo que são apresentados naquele momento, resolve de forma assustadoramente simples um crime que teria destruído Israel em um turbilhão de intolerância religiosa, Assassinato no Expresso do Oriente parece ser um filme feito para outra época, mas com orçamento e produção de hoje em dia. À exceção de algum desleixo em paisagens feitas em computação gráfica, tudo aqui é feito à perfeição. Os cenários, os figurinos e a ambientação de época são fantásticos e montam o palco para o que, a julgar pelo elenco, promete ser nada menos do que espetacular.

Contudo, de alguma forma, não é assim que a coisa transcorre. Branagh é conhecido por ser um ator e diretor shakespeariano, sendo responsável pela talvez mais relevante e fiel adaptação de “Hamlet“, a mais famosa peça do bardo inglês, para os cinemas. Em suas adaptações, ele sempre se notabilizou pela fidelidade ao texto original, muitas vezes até mesmo em detrimento da nova mídia à qual aquilo estava sendo adaptado.

Neste longa, seu compromisso com uma narrativa fiel ao livro até mesmo na estrutura é ao mesmo tempo um acerto e também seu maior erro, uma vez que acaba por fazer com que na mídia Cinema a história fique um tanto truncada, dando uma impressão de falta de informações suficientes aos espectadores que lhes permitissem chegar sequer perto das deduções de Poirot. E isto acaba por prejudicar o maldito ritmo do qual meu amigo Marco Medeiros, brilhante colaborador aqui do MetaFictions, tanto fala. Meu pai babando ao meu lado em duas oportunidades diferentes deixou isso bem claro.

Mesmo com este problema (e também com que me pareceu um excesso do uso da computação gráfica), o longa cumpre seu papel ao se valer de um elenco afiadíssimo (com destaque absoluto para o Poirot de Branagh) e de uma produção impecável. Detalhe para o easter egg para os fãs de Agatha Christie ao final do filme e que anuncia que talvez estejamos aqui diante do início de uma nova franquia.

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