Crítica: DEVILMAN: crybaby

Eu, enquanto advogado por formação – não se esqueçam do escroto por vocação ali na assinatura abaixo 😉 -, me sinto obrigado a fazer uma ressalva aqui logo de cara, mesmo correndo o risco de, ao fazê-la, conseguir exatamente o efeito diametralmente oposto ao desejado. Se você tem menos de 18 anos, não veja DEVILMAN: crybaby, não veja o trailer, não leia essa resenha e apague qualquer menção a este anime da sua vida até atingir a idade adulta.

Eu digo isso porque este é o anime mais inacreditavelmente adulto, explícito e gráfico que eu já vi e, apesar de não ser o especialista/otaku que Ryan Fields é, não me surpreenderia se alguém disser que nunca fizeram algo assim antes.

E a razão de eu dizer isso está perfeitamente contida logo no 1º episódio. É sangue, desmembramento, decapitações, closes ginecológicos nas mulheres, teta balançando pra todo lado, sexo (hetero e homo), orgias, uso de drogas… É basicamente tudo que faz com que as mães comecem uma campanha para se tirar um programa do ar. Só não tem rola ou buceta aparecendo, já que o Japão, país onde o bukkake foi inventado (e se você não sabe o que é bukkake, você também não deveria estar lendo isso aqui), não permite que genitálias fiquem aparecendo soltas por aí sem dar aquela borrada na imagem, o que é maior corta tesão do caralho.

Não vou aqui ficar tirando a onda de que eu li o mangá e vi a série original. Ambos foram lançados entre 72 e 73, 10 anos antes de eu nascer, e permaneceram um tanto obscuros por todo esse tempo, imortalizados quase que exclusivamente como as grandes influências dos criadores de outras séries que, essas sim, são clássicas e já há bastante tempo referência nos animes: “Evangelion” e “Berserk” (meu favorito, inclusive).

Só que DEVILMAN: crybaby (grafado desta forma por razões que se tornam óbvias ao assistir) é MUITO mais adulto do que os anteriores. Eu estou falando sério. Eu tenho até alguma dificuldade de lembrar de um filme live-action com escolhas visuais tão adultas quanto essa série. É realmente MUITA putaria e MUITA violência, e, por vezes, os dois andam de mãos dadas.

E, incrivelmente, todo esse desvario insano, por um fiozinho de cabelo, consegue a proeza de não ser apelativo. Tudo faz sentido dentro da temática que é abordada e é brilhante e estonteantemente animado. Não há adjetivos para se descrever a escolha do estilo de animação e a qualidade do que é mostrado em tela. Indo na contramão das detalhadíssimas e tecnicamente virtuosas animações estabelecidas por grandes sucessos recentes como “Your Name” (resenhado aqui) e da tendência (que eu não gosto) de se usar animação em 3D (“Ajin“, “Knights of Sidonia” para ficar só na própria Netflix), DEVILMAN: crybaby parece ter sido animado pelo mesmo pessoal cheio de ácido e demais substâncias psicotrópicas das animações europeias da década de 70/80 como “Heavy Metal“, ainda que retenha características de traço que o localizam inequivocamente como um autêntico anime japonês.

Tudo é psicodélico, estilizado e contribui de forma ímpar para a história, que trata de temáticas atemporais como a dualidade do indivíduo, o bem e o mal, além de ser uma crítica ao estado cada vez mais beligerante do ser humano (polarização que é hoje alimentada pelas redes sociais) e ao uso indiscriminado de drogas.

E, por falar em história, vamos a ela. Akira Fudo é o Devilman e o crybaby da história. Ele é um moleque que parece ter sido criado pela vó e que chora por tudo, daí o nome crybaby (chorão, em tradução livre). Ele tem um amigo loiro, de olhos azuis e que só usa branco chamado Ryo Asuka. Esse malandro é aquele típico personagem de anime que é totalmente cerebral, frio e racional, um perfeito contraponto ao emotivo ao extremo Akira, o que está bem explicitado também no figurino dos dois.

Os 4 primeiros episódios da série te esmagam como um rolo compressor. Sério mesmo. É difícil parar de assistir justamente porque as imagens fascinam. Animados dessa forma estranhamente maravilhosa, o espectador é ambientado na mitologia da coisa toda, com a apresentação também de outros personagens que você fatalmente verá nus em algum momento. Akira é construído como aquele cara meio bobão, com um coração tão bom que acaba se metendo em enrascadas por causa do sentimento que nutre pelo próximo e é isso que lhe permite adicionar o DEVILMAN ao seu já estabelecido crybaby.

É justamente no desenrolar dos episódios e na relação entre Akira e Ryo que a coisa sai um pouco dos eixos, com situações um tanto previsíveis, por vezes forçadas e verdadeiramente escalafobéticas. De todo modo, trata-se do melhor anime original que a Netflix já produziu, sendo claríssimo que foi dado aos realizadores TOTAL liberdade para criar a loucura-apocalíptica-putaria-satanista verdadeiramente foda que criaram, ainda que haja um declínio sensível na qualidade dos episódios a partir do 5º, o que é perceptível até mesmo nas animações, que são o ponto forte do anime, e que passam a ser mais contidas e tradicionais, mantendo, ao menos, o traço.

Print de presente pra rapaziada.

No fim das contas, o saldo é bem positivo. E é uma pena que, se a série respeitar o que foi o mangá, não teremos uma segunda temporada. Atiçou a minha curiosidade para ver o anime Cyborg 009 vs Devilman que está na minha lista da Netflix há décadas, apesar de parecer uma porcaria. Alguém aí já viu?

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