Crítica: 15h17: Trem para Paris (The 15h17 to Paris)
Foi no dia 21 de agosto de 2015, após já estarem há horas mofando no trem nº 9364 da companhia Thalys que saiu às 15:17 de Amsterdam em direção a Paris, que os amigos Spencer Stone, Anthony Sadler e Alek Skarlatos, todos com nomes de estrelas do cinema como brincaria depois o diretor desta obra, se tornaram heróis casuais de uma guerra tão horrível quanto invisível aos olhos tupiniquins.
Em um momento de bravura semelhante ao dos heróis do nada menos que espetacular “Voo United 93“, no qual os passageiros do tal voo impediram que mais um avião fosse usado como um aríete alado ao aceitarem fazer o derradeiro sacrifício pessoal em nome do bem comum no fatídico dia 11 de setembro de 2001, os amigos enfrentaram e renderam um terrorista armado com pistolas, uma AK-47 e munição suficiente para matar quase todos os 500 passageiros do trem.
Trata-se de uma história real e intensamente inspiradora, para a qual o diretor, o lendário e seminal Clint Eastwood, tomou uma decisão arriscada ao escalar nos papéis principais de Spencer, Anthony e Alek os próprios rapazes que viveram o ocorrido. Sim, leitor, tirante o primeiro terço do filme em que somos apresentados a enfadonha sequência de cenas que dão conta da infância dos três, as estrelas do filme são as próprias pessoas que viveram esta situação extrema e saíram vivos para contar a história, receber todos os mais altos láureos da França e dos EUA e inspirar em todos nós o espírito de iniciativa imortalizado na célebre frase de Edmund Burke de que “a única coisa necessária para que o mal triunfe é que os homens de bem nada façam”.
Infelizmente, os amigos (e Clint também) não foram ajudados pelo roteiro de Dorothy Blyskal, adaptado do livro escrito pelos três no qual relembram o evento. Isto porque a adaptação entra numa vereda um tanto piegas demais ao explicar a infância dos moleques e como que a amizade deles lhes teria levado até aquele momento no qual, diante da morte, todos tomaram atitudes arriscadíssimas em nome de um chamado maior.
O roteiro é recheado de cenas desnecessárias (que parecem estar ali apenas para dar algum estofo aos personagens, mas que acabam sendo apenas repetições de coisas já estabelecidas) e diálogos que, sendo interpretado por atores amadores, soam estranhos, forçados e muitas vezes até mesmo constrangedores. O filme, por falar nisso, está repleto de momentos de certa vergonha alheia por um monstro mais do que sagrado do Cinema como é Clint Eastwood, não em pouca medida por causa da trilha sonora e do desenho de produção que parecem algo feito para um filme televisivo da década de 90, além da interpretação um tanto novelística por parte até mesmo do elenco profissional.
Perdendo quase todo o seu tempo de exibição ao tentar desenvolver os personagens, a obra fracassa na maior parte do tempo justamente pela redundância das cenas apresentadas. O objetivo a todo momento é demonstrar o quanto o laço de amizade entre os três é forte, tudo de modo a, ao final, demonstrar que foi só a força da amizade deles que lhes permitiu prevalecer sobre o atirador, o que, talvez Eastwood nem tenha percebido isso, é descomprovado enquanto essa verdade absoluta quando Spencer está na mira do terrorista. A força desta amizade, contudo, já está mais do que demonstrada antes da metade do filme, com o resto do tempo sendo utilizado como que para criar uma tensão que nunca chega sobre o que sabemos que acontecerá mais ao fim.
Anthony, Alek e, principalmente, Spencer são heróis de verdade, na acepção da palavra e não no sentido empregado por Pedro Bial no BBB. Isto é inegável. A história deles inspira e dá alguma esperança ainda a humanidade. E é por causa da força dessa história – e da realista cena final em que os amigos reencenam um momento que deve ter sido de extremo trauma para todos os envolvidos – que o filme não se afunda totalmente em seus equívocos de produção.
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