Crítica: Minha Primeira Luta (First Match)

O sentimento humano mais parece um conjunto de respostas condicionadas por determinadas situações. Geralmente, aquelas pessoas que se apresentam de maneira frágil aos conflitos da vida foram criadas para não conseguir lidar com certos tipos de obstáculos. Outros, porém, mostram-se frios diante dos mais pesados momentos. Há aqueles que carregam suas cicatrizes de tanta porrada que já levaram e tendem a responder tudo na base da mesma porrada, tornando-se destrutivos tal qual o meio em que nasceram.

Minha Primeira Luta, novo filme original Netflix, conta a história de Mo (atuada com energia por Elvire Emanuelle), uma adolescente cujo único familiar vivo é o pai Darrel (com extrema naturalidade por Yahya Abdul-Mateen II), presidiário a ser solto em breve. A jovem negra é “acolhida” em lares adotivos, que mais se assemelham a mini-fábricas de selvageria, nos subúrbios pobres dos Estados Unidos. Sempre se envolvendo em intrigas, já interiorizando o modus operandi daquelas comunidades, Mo costuma fugir até ser direcionada para uma nova família pela assistência social da região. Permanece assim enquanto mantém a esperança de que, quando solto, seu pai voltará a ter sua guarda. Mas percebe a ingênua espera quando, acidentalmente, esbarra com ele (já livre) pelo bairro.

O modo como ela vê.

Mo percebe que só poderá chamar a atenção de seu pai se entrar pelo mesmo caminho de seus colegas homens de escola: a luta-livre, vez que seu progenitor é um ex-lutador desse esporte e campeão estadual em seus dias de outrora. Fazendo de tudo para ser parte de uma equipe só de meninos, tendo que lutar contra o sexo oposto de igual para igual, Mo consegue despertar curiosidade no técnico do colégio, encontrando uma forma de canalizar a violência que a moldou como pessoa. Dessa forma, a estratégia pretendida, a princípio, surte efeito e Darrel começa a se relacionar mais de perto com sua filha. No entanto, isso a permite ver que o pai anda a cometer os mesmos erros que o colocaram no encarceramento do qual, há pouco, se viu livre.

A menina, então, luta pelo afeto de seu pai, enquanto luta nos rings escolares, tornando-se cada vez mais vencedora. No entanto, Minha Primeira Luta não vira aquele filme de lutador vencedor que descobre no equilíbrio do esporte uma saída para seu mundo cão. Mo é a negra pobre sem família e sem perspectiva que só sabe machucar as pessoas à sua volta, pois tudo o que as suas relações de vida fizeram foi machucá-la em um primeiro momento. É a regra do retorno imediato: por viver violência, suas respostas são sempre violência. É a pessoa envolta em uma casca grossa que não se permite mais ser ferida por qualquer eventualidade que surja. De todo modo, a única coisa que a torna plenamente vulnerável é a presença/ausência de seu pai e sua verdadeira luta será saber lidar com a figura controversa que ele é.

Sua verdadeira luta.

Escrito e dirigido por Olivia Newman, a obra é um passeio pela personagem Mo, fazendo o espectador conhecer cada camada dela até estar de frente para sua essência; entendendo suas ações e reações como tão somente respostas imediatas às situações nada pueris que fora obrigada a enfrentar desde sempre. O meio pouco convidativo e extremamente hostil no qual vive são as peças necessárias para o entendimento de um ser fechado em si mesmo, que balança no fio da navalha entre a insegurança/carência e a dureza/frieza proporcionadas pelo caos de cada um de seus dias.

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