Crítica: Wild Wild Country
A NETFLIX socou o peito do mundo quando liberou o documentário serial “Making a Murderer” (com Assista! no site), que certamente é uma das melhores obras de seu catálogo original. Como discorre Rene Vettori no Assista! supracitado, vimos como o sistema judicial é extremamente corrompido e que a Justiça usa uma venda nos olhos para não ver as atrocidades cometidas em seu nome por aqueles que deveriam servi-la
Seguindo uma proposta menos ousada, mais curta e com tema mais social, a NETFLIX apresenta em Wild Wild Country como nos EUA, mesmo agindo completamente dentro da lei, podemos cometer atrocidades e ainda nos sentirmos moralmente justificados.
Caso você não tenha crescido nos EUA durante a década de 80 e não veja Discovery Channel, muito provavelmente não conhece a cidade de Rajneeshpuram, situada na zona rural do estado do Oregon, e toda a novela que se deu desde a sua criação.
Antes de adentrarmos pelos meandros dessa crítica, é importante ressaltar que o documentário não é sobre o Rajneesh Chandra Mohan, como era conhecido na Índia, ou Bhagwan Shree Rajneesh, seu nome adotado nos EUA, e nem Osho, como ficou conhecido mundialmente o criador da seita que é o objeto central do documentário. Mesmo com a sua arte da meditação e do despertar da consciência globalmente reconhecidos, o filósofo (sim, ele tem uma graduação) Osho é apenas o estopim de algo muito maior: a luta entre grupos sociais.
Após sofrer diversos preconceitos em sua terra natal, a Índia, onde criara a sua seita, Osho dá continuidade a sua utopia nos EUA com a compra de um latifúndio na pacata cidade, com 50 habitantes, de Antelope. Estamos falando de uma época nos EUA pós Vietnã, com o fantasma de Jonestown (onde um culto com líder carismático cometeu suicídio coletivo, levando perto de mil almas) assombrando a psique americana e estamos numa cidade cristã, com muitos idosos pobres e com noções fortes de nacionalismo. Essa é a receita ideal para dar uma merda inacreditável.
De um lado temos o amor e a fraternidade dos Rajneeshees (membros desse culto), e do outro as tradições e a xenofobia de uma sociedade que, teoricamente, fica na terra da oportunidade que foi usurpada dos índios nativos. E se tem algo que se pode fazer em um país que se orgulha da liberdade dada pela Constituição é aproveitar as brechas que o sistema cria para prevalecer sobre o grupo rival.
O documentário consegue expor com maestria como ambos os grupos possuem uma grande flexibilidade moral para atender as suas necessidades. Mostra também que o que chamamos de direitos são, na verdade, privilégios temporários (como bem já dizia George Carlin) e que violência só gera uma resposta de igual intensidade no sentido inverso, independente de você ser cristão ou seguidor de um culto que prega amor fraterno.
Wild Wild Country não é aquela obra-prima que vai te deixar de queixo caído ao final dos seus 6 episódios. A série carece de um bom ritmo, alternando momentos lentos sem muito a acrescentar, com a intensidade de acontecimentos que você vai custar a acreditar que são legais. No entanto, o maior problema do documentário são alguns relatos e pessoas entrevistadas entendiantes e/ou irrelevantes para o desenrolar da história.
Ao subir os créditos do último episódio, fiquei admirado com a inocência do culto ao tentar viver no mundo como se não existissem bandeiras, fronteiras, preconceitos e intolerância e, ao final, com a incoerência de viverem somente por isso.
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