Crítica: Um Lugar Silencioso (A Quiet Place)
A cinematografia mundial tem investido em cenários pós-apocalípticos para contar suas histórias. Nada mais justo em um momento no qual o desgaste natural é evidente e alcança níveis alarmantes, chegando ao ponto sem retorno. No entanto, boa parte dessas obras debatem como a natureza se volta contra o homem ou como ele próprio foi o responsável por aquela situação de caos total. Mas John Krasinski se utiliza deste mesmo cenário para ser o palco de um filme de terror. Associando-se, portanto, este gênero a uma proposta largamente utilizada atualmente, ter-se-ia tudo para cair num lugar-comum. Mas Um Lugar Silencioso passa longe disso.
Cidades abandonadas, ruas vazias, lojas reviradas. Neste universo quase fantasmagórico, uma família tenta conseguir mantimentos. Todos andam descalços e lutam a cada instante para não fazer o menor ruído que seja. Aos poucos, somos convidados a esta nova ordem mundial, onde ninguém pode produzir um som mais alto do que o comum naquele ambiente. Caso contrário, uma espécie de criatura, vinda de algum lugar por perto, os consumirá em poucos segundos. Esse é o drama dos líderes de família Lee (no tom certo pelo próprio diretor John Krasinski) e Evelyn (atuada com força pela excelente Emily Blunt), com seus dois filhos pequenos, a já adolescente e deficiente auditiva Regan (encarnada com presença por Millicent Simmonds) e um a nascer, desenvolvendo-se silenciosamente na barriga da matriarca.
“Se não pudermos protegê-los, não há razão para a nossa existência”, enfatiza ela em determinado momento (talvez não com essas exatas palavras). Nada no dia a dia desses personagens soará comum. O mínimo detalhe, a mínima ação diária, cobrará o maior esforço de cada qual para se manter vivo em um ambiente hostil para todo e qualquer ser vivente. Uma “nova” linguagem tem que ser assumida, fazendo com que eles se comuniquem, basicamente, por meio de sinais (libras). Eles, portanto, adentram um pouco no mundo da filha Regan, que se sente culpada por sua deficiência e menos amada do que seus irmãos.
Krasinski se utiliza das relações pessoais duradouras, por meio do afeto, como a saída para a sobrevivência, descrevendo um núcleo familiar sólido, que se apresenta como único recurso para atravessar a adversidade que se faz onipresente. O que está em jogo para os seus personagens não é o que o mero maniqueísmo oferece: vencer aquelas criaturas que ameaçam suas vidas. A chave principal dessa história é única e exclusivamente a sobrevivência.
Fazendo Cinema no seu sentido mais estrito, contando a história através de imagens em movimento e sem apelos clássicos de jump scare, como usualmente produzem as obras de terror, Krasinski realiza um filme forte, com tensão a transbordar em cada uma de suas sequências a partir dos olhos e ouvidos de personagens fortes e demasiado humanos, que, como prega o instinto de qualquer animal, desejam atravessar o dia íntegros para que possam acordar na manhã do próximo. Assumindo o sacrifício necessário que isso cobra.
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