Crítica: A Barraca do Beijo (The Kissing Booth)
Toda vez que alguém produz um filme há várias questões que devem ser levadas em conta: que gênero de filme quero produzir? Pra que público alvo? Como quero contar tal filme? Com que linguagem? Há outros filmes como esse? Provavelmente sim. Então o que vou apresentar de igual e o que haverá de diferente? Quem serão os atores?… Se o filme é baseado em um livro, então recomeça a luta: quanto do livro devo usar? Como fazer corretamente a transposição de mídia mantendo a essência do texto original? Devo manter a essência do texto original? O quanto?
Em A Barraca do Beijo (The Kissing Booth, no original, adaptação do romance homônimo de Beth Reekles) o camarada que se sentou para tomar tais decisões deve ter passado por bons bocados. Primeiro que ao se fazer um filme adolescente você enfrenta já de cara o legado que os anos 80 deixaram para trás, com filmes de gente como John Hughes, que não apenas definiram um gênero cinematográfico, mas definiram uma geração. E isso traz, em si, um desafio inevitável: cito Hughes ou não cito Hughes? E quanto? A tentação é em fazê-lo. O féladaputa conseguiu sincretizar o que foi ser adolescente naquele momento exato do tempo de uma maneira escrotamente precisa, enquanto que ao mesmo tempo traçava um esboço quase que universal de o que é ser jovem no mundo ocidental – suas dores e desejos. É quase doloroso não tentar reviver algum daqueles momentos. Não tentar requentar aquela sensação brilhante, trazendo-a para o momento histórico atual (confira nosso Nostalgia: Clube dos Cinco sobre isso).
E o filme tenta fazer isso. Tenta com tanto afinco que até Molly Ringwald, a rainha dos filmes do gênero nos anos 80, está nele, como a mãe fofa dos dois rapazes protagonistas do filme: o gatão e seu irmão mais novo, o melhor amigo da mocinha. E o enredo começa aí. Menina meio “dorkzinha” é a melhor amiga de um garoto tão manezão quanto ela desde o dia em que os dois nasceram (e eles nasceram no mesmíssimo dia, filhos de duas melhores amigas há mais de 20 anos! Waw!). Sua amizade prosseguiu inabalável até que o irmão brigão do guri se transforma naquele camarada de 30 anos com o tórax do Chris Hemsworth e a cara de algum membro de alguma boy-band fazendo-se passar pelo quarterback no último ano de high school. A menina nerdzinha, por sua vez, tomou hormônios durante o verão pra ver se cresce (sério!!) e ficou gostosa de uma hora pra outra e pronto, deu ruim. Adicione a isso uma barraca do beijo em uma feira de escola… É, filme de adolescente dos bons.
O filme explora a importância da amizade mas também de crescermos e entendermos que amizades precisam amadurecer também. Fala do primeiro tudo: primeiro beijo, primeiro amor, primeira transa, primeiro coração partido, primeiro porre, primeiro strip de pé numa mesa de sinuca (…???!!!). É bobo, eu sei. É pra ser bobo. O filme é inspirado num bestseller adolescente escrito por uma colegial de 15 anos do País de Gales. É por adolescente, para adolescente. Então tendo o filme sido feito para uma menina de 14 anos (que eu não sou!), creio que devo compreender o que ele pretendia e, acho que, mesmo que nos meus parâmetros atuais (de um homem de 41) o filme seja raso e estereotipado, ele ainda consegue divertir e falar o que pretendia de maneira eficiente. Tenho certeza que meninas de 14 anos pelo mundo afora vão curtir ver a patinha feia da escola de uma hora pra outra se amassando com o Thor.
Então por que não uma nota melhor? Há um problema no filme que não se trata de ser ou não raso ou pueril. O filme tenta agradar a todos. Tenta fazer suas referências a Hughes com várias versões moderninhas de músicas dos anos 80, vários “gags” (piadas) que caberiam nos filmes daqueles tempos mas que hoje em dia parecem forçadas e meio ridículas, além de uma certa “perfeitização” excessiva de tudo (todos são ricos, bonitos, felizes e perfeitos, mesmo os imperfeitos, infelizes, feios e pobres), coisa típica da era Reagan. Além disso, na tentativa de agradar aos fãs do livro, o texto me parece excessivamente baseado nele, com direito a narração em “off” da protagonista, como uma narradora-personagem de… um livro. E, como cereja no bolo, tentaram trazer o dialeto falado nos colégios da Califórnia pra um filme, com aqueeeelas pessooooas que faaaaalam assiiiiim o teeeempo tooodo, maaaano. Chato. Bem chato. Mas, como eu disse, eu não sou o público alvo do filme. E creio que este público está se lixando pra tudo o que eu disse no último paragrafo.
E com toda razão.
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