Crítica: Tau
Federico D’Alessandro, além de ter um sobrenome que causa um frisson quase sexual aos colorados, é um conceituado e verdadeiramente talentoso artista visual. Basta dar uma olhadinha em seu perfil no IMDB para que suas credenciais nesse quesito – tanto em blockbusters de super-herói quanto em filmes mais delicados e introspectivos como o subestimado “Onde Vivem os Monstros” – saltem aos olhos. E foi na estreia dele como diretor de longas que a Netflix apostou para este Tau, certamente confiando que, dadas as credenciais do malandro, teria em mãos mais uma obra visualmente impressionante.
Contudo, apesar do aspecto visual ser sem dúvidas o ponto alto desta obra, até ele sai devendo em mais um original Netflix que deixa muito a desejar em todos os aspectos, inclusive naqueles que dizem respeito exclusivamente ao desenho de produção e efeitos visuais.
Tau é uma espécie de híbrido de “Jogos Mortais” com “O Passageiro do Futuro” e o nome de Gary Oldman em seu cartaz, o que por si só é suficiente para me fazer assistir a qualquer coisa. Já deixo claro, sem medo de dar spoiler, que a participação de Oldman é das coisas mais frustrantes que já experimentei, chegando quase ao nível de “Momento Crítico”, filme merda dos anos 90 estrelado por Kurt Russel e Steven Seagal, mas no qual Seagal (ou seria Russel) morre nos primeiros 10 minutos. Oldman dá voz a inteligência artificial chamada Tau e participa do filme todo, mas sua voz de GPS paraguaio mal é reconhecível, indo embora com essa robotização qualquer nuance que ele talvez tenha tentado dar à sua atuação.
A premissa não é nada inspirada ou original. Julia (Maika Monroe) é uma escrotinha que se vale do fato de ser gata para pegar gente na noitada e aproveitar para também roubar essas pessoas, tudo porque ela teve uma infância muito difícil. E essa é a única construção do personagem que há. Ela, ainda nos primeiros minutos, se vê sequestrada por uma espécie de cientista maluco chamado Alex (Ed Skrein, o Daario Naharis de Game of Thrones, aqui irreconhecível) cuja profundidade também para por aí. Ele é cientista. Ele é maluco. Ele fará de um tudo para conseguir completar sua pesquisa. E é isso.
Daí em diante, Julia é apresentada a tal Tau (#orgulhosodocacófato), uma inteligência artificial totalmente subordinada a Alex, mas que, do mais absoluto nada, às vezes se comporta como um cachorrinho, sendo a partir da relação entre estes três personagens que a história se desenvolve dentro de um contexto no qual Alex quer usar Julia para, valendo-se de Tau como seu assistente de cientista maluco, terminar sua pesquisa em inteligência artificial. E é justamente neste desenvolvimento, ou na tentativa dele, que Tau naufraga. Basta olhar para a foto acima. Isso aí parece a interação entre duas pessoas que estão numa situação em que uma encarcera, agride fisicamente e ameaça de morte a outra?
Além do roteiro forçar situações absolutamente inverossímeis, ele peca ainda mais em diálogos que por vezes são só constrangedores, por outras vezes só clichezentos e no restante delas são as duas coisas ao mesmo tempo. É coisa do tipo “- Isso não vai doer nada em você. / – Mas em você sim!” e porrada em cima do moço da forma mais previsível que se pode imaginar. E o roteiro em nada é ajudado pela equivocada direção de atores, que apresentam atuações em tons incoerentes entre uma cena e outra, com escolhas dramatúrgicas que me fizeram coçar a barba a maior parte do filme.
No aspecto técnico a coisa não muda de figura. A edição do filme é confusa e insegura. Os efeitos especiais e o desenho de produção também pecam bastante. À exceção do que se pensou enquanto interação com Tau e a própria representação física do avatar da inteligência artificial, todos os demais efeitos parecem alguma coisa levemente melhor do que o Chapolin voando em seus aerólitos (ou seriam aerolitos), além de genéricos. Há um robozão aqui que é animado só com um tiquinho mais de esmero do que o ED 209 fabricado pela OCP em Robocop. Inclusive, em determinado momento do filme eu fechei os olhos por uns 30 segundos e me dei conta que os efeitos sonoros são idênticos.
Com sua filosofia existencialista de botequim, uma direção desastrosa e um roteiro que esposa diálogos lamentáveis, Tau até que parte de premissas interessantes e cada vez mais relevantes sobre a nossa relação com a tecnologia e o surgimento iminente de uma verdadeira inteligência artificial, mas é só.
Caso você tenha um crush em Maika Monroe, a Netflix tem dois filmes protagonizados por ela e indicados em nossos Garimpos Netflix aqui e aqui. Já quanto a Gary Oldman, caso você tenha um crush nele, alguma coisa de certa você está fazendo em sua vida.
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