Crítica: Buscando... (Searching)

“Every Breath You Take” é uma das músicas mais mal-interpretadas da história do rock, além de fazer parte dos hits clássicos dos anos 80. Tomada por uma canção de amor na sociedade doente em que vivemos que romantiza ciúme e possessão, é na verdade uma narrativa bizarra de vigilância. Arrisco usar o termo panoptismo, bem focaultiana mesmo; e nesse contexto, a letra trata da obsessão e ideia de controle de relacionamento amoroso. Quando pensado o mundo tecnológico onde estamos online 24 horas por dia, inevitavelmente essa trilha sonora toca na minha cabeça.

Essa conexão tão constante traz uma sensação, ainda que inconsciente, de segurança e alívio por falsamente nos colocar no controle: sabemos onde a maior parte das pessoas do nosso ciclo está, o que está fazendo, com quem, etc. Mas o fato é… sabemos mesmo SOBRE essas pessoas? A partir desse questionamento, o filme Buscando… traz a história de David Kim (John Cho), um pai que se depara com o misterioso desaparecimento da filha, Margot (Michelle La), com quem aparentemente mantinha uma relação próxima.

A ênfase na tecnologia é tamanha que o filme é inteiramente mostrado a partir da tela de computador do pai através de mensagens, videochamadas, e-mails e câmeras de vigilância de diferentes ambientes. Tal aposta do diretor Aneesh Chaganty poderia ter saído como um recurso preguiçoso e cansativo; no entanto, a escolha cai como uma luva e sua condução se mostra meticulosa e certeira, trazendo ao longa dinamismo e caracterizando-o com inovação.

Kim começa a incessante busca pela filha, vasculhando por sites comuns entre adolescentes, desde o famigerado Facebook até o alternativo Tumblr, a fim de descobrir mais sobre Margot. É aí que a ficha do cara caí: ele descobre que não só não faz ideia do que é Tumblr como não conhece a própria filha – seus amigos, lugares preferidos e dramas estão todos online e, ainda assim, ausentes na vida offline em família. Aberta uma investigação policial, segue um clichê bastante batido que é o do civil bancando o detetive enquanto a polícia falha pateticamente em achar pistas bastante óbvias sobre o caso.

Não fosse o ato final forçado e desnecessário, minha avaliação do filme seria maior. No entanto, devido a uma escorregada feia de roteiro – da qual lhes pouparei por motivos de spoiler -, trata-se de um bom filme – mas não excelente. Para além, ele conta com eficaz suspense, boas atuações e interessante reflexão sobre essa era de redes sociais toda em que as gerações sentem cada vez mais a necessidade de super-compartilhar suas vidas e, curiosamente, mantêm tudo num nível bastante superficial no fim das contas.

Nesse sentido, repensamos junto com David sobre as relações que mantemos com o outro: será mesmo que o frequente contato virtual consolide o que chamamos de proximidade? Ou, na verdade, a profundidade dos laços se mistura com a banalidade e rapidez do envio de uma mensagem? Precisamos mesmo dessa constância toda e, se não, não é mais saudável desprender-se do virtual sempre que possível?

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