Crítica: O Terceiro Olho (Mata Batin)
Usualmente, quando gostamos muito de algo, tendemos a produzir coisas semelhantes em manifesta e declarada influência que este algo nos causa. Martin Scorsese, mesmo com sua genialidade imperativa, por vezes traz cenas ou temas a seus filmes que foram diretamente influenciadas por obras que lhe são ricas até hoje. Isso é completamente normal e comum a todo e qualquer artista. Alguns utilizam de uma releitura, outros optam por deixar a referência tanto mais explícita. O filme de terror da Indonésia O Terceiro Olho, de Rocky Soraya, é um exemplo que vai para além dessa comum prática aqui aludida.
Alia (meio perdida por Jessica Mila) seguiu sua vida mudando-se para Bangkok, deixando na Indonésia seus pais e a irmã mais nova Abel (firme por Bianca Hello). No entanto, um trágico acidente deixa as duas órfãs e Alia decide retornar para cuidar de Abel. Esse retorno à sua cidade de origem irá remeter as duas a diversos outros retornos. Para conseguirem arcar com as novas despesas, as irmãs deverão voltar a morar na casa de infância deixada como herança e, com isso, revisitarão antigos medos, já que nesta habitação a menor costumava ver aparições do além, que interagiam fortemente com ela. Acompanhadas pelo namorado Davin (Denny Sumargo), as meninas tentam superar o trauma familiar.
Neste momento, o filme já apresenta uma definitiva falha de direção, pois, ao chegar à casa antiga, Alia se mostra constantemente sorridente, mesmo tendo perdido os pais de uma só vez há tão pouco tempo. Em contraste, as feições soturnas de Abel permanecem, mas muito menos pela ausência de seus progenitores e muito mais pelo medo constante do que passara naquele terreno. Uma perda dessas supõe-se muito mais presente do que a atenção despejada por Rocky Soraya em sua narrativa. Uma vez de volta, Abel anda o tempo inteiro com fones ouvindo música, para não escutar sons vindos do plano espiritual. Achando que a menina sofre de algum distúrbio psiquiátrico, Alia leva a irmã para uma espécie de guru a que sua mãe costumava levá-la. Windu (Citra Prima) explica que o que a pequena tem é o Sexto Sentido (olha o primeiro parágrafo desta resenha se fazendo presente aqui), o Terceiro Olho que está aberto, permitindo-a interagir, ainda que a contragosto, com almas perdidas. Para não mais duvidar dela, Alia pede que seu terceiro olho seja aberto à força. Windu realiza o desejo de Alia, que passa a ser assombrada por um sem-número de assombrações em todo e qualquer lugar. As visões irão conectar vários acontecimentos que ligam personagens da história à casa onde as irmãs moram. Elas irão batalhar espiritual e fisicamente para conseguirem se manter sãs em meio a tantas investidas das almas penadas.
A narrativa vai fazendo uma costura das principais obras de terror da atualidade, sendo muito claramente – mas MUITO claramente – sua principal influência James Wan (não li nada a respeito, mas é por demais identificável). Vemos cenas que dialogam diretamente com o universo criado por ele, também curiosamente de origem indonésia, em obras como “Annabelle”, “Invocação do Mal” e, sobretudo, “Sobrenatural”. Fora outras obras como o já citado “O Sexto Sentido” e também “O Exorcista”. A impressão que dá, em determinado momento, é que o diretor quis prestar uma homenagem ou realizar um filme que integrasse os principais elementos das histórias que ele mais gostou. Humanos indo para o limbo do plano espiritual (como em “Sobrenatural”) para recuperar sua integridade e encaminhar as almas perdidas; espíritos que se escondem em cortinas e lençóis e caminham rapidamente para o seu alvo (“Annabelle”); pessoa possuída e amarrada a uma cama para a exorcização das entidades (“Invocação” e “O Exorcista” – até uma cabecinha girando 180º tem, parceiro); e até mesmo a releitura da frase mais conhecida “eu vejo pessoas que não estão mais vivas” (“O Sexto Sentido”). Está tudo ali. Tudo de uma vez e a um só tempo em um conto bem macabro e recheado de sustos.
Em contrapartida, Rocky Soraya parece deixar de lado outras influências (inclusive de muitos desses títulos), como associar profundidade à tensão digna do gênero. Como comumente vemos em obras de terror, a história principal é um mero pano de fundo a justificar as sequências de medo e susto que demarcam o território desse estilo narrativo. No entanto, se é exatamente isso que você está procurando, mergulhe fundo nesse conto, pois (apesar de alguns efeitos especiais serem bem fracos, possivelmente pela falta de recursos) as cenas assustam de verdade e a sensação de medo permanece durante a maior parte do filme; o que é uma das assinaturas das obras orientais de horror. Tudo bem que sou bem sensível a temas como esses, mas a minha “cagalança” durante a maior parte da obra foi deveras sincera.
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