Crítica: As Viúvas (Widows)

Havia muito tempo eu não ia às cegas ao cinema. Porém, neste final de semana, após assumir a responsabilidade de fazer esta resenha, aventurei-me sabendo nada além da presença de Viola Davis. Não conhecia a trama, não assisti ao trailer, não sabia sobre o elenco estelar e só vi o poster no momento da compra do ingresso. E caso você esteja se perguntando, eu também não assisti “As Damas de Ouro“, minissérie que inspira a produção do longa. Confesso, apesar de certa angústia, me sentir um tanto ansioso para conhecer os meandros de uma obra relativamente bem falada… mas, como já postulou nosso editor-chefe, “a expectativa é a mãe de todas as decepções”.

A minha decepção não vem do resultado final, mas ela surge do abismo entre o que o filme entrega e o que ele poderia ter sido. Temos uma situação onde o palco armado para o show foi mais interessante do que o show em si. Começamos com uma cena de abertura que parecia definir o tom da película, com 4 assaltantes fugindo da polícia até que eles são mortos em um galpão por uma explosão, deixando suas esposas viúvas (isso não é spoiler, é o nome do filme).

Porém, uma das viúvas, Veronica (Viola Davis), recebe uma visita indesejada. O dono do dinheiro roubado e destruído na explosão, Jamal Manning (Brian Tyree Henry), aparece e transfere a dívida do marido, Harry (Liam Neeson) para ela, dando 1 mês de prazo para o pagamento. Veronica, de posse do caderno de Harry, que contém informações do próximo roubo do falecido, junta a trupe de viúvas, já que todas estão necessitadas, para realizar esse “trabalho”.

Durante esse percurso, a obra apresenta alguns acertos. Dentre eles, o mais significativo e bem desenvolvido foi a busca de independência dessas mulheres, que passam a assumir as rédeas do seus destinos e trilham um caminho muito improvável, mas que, infelizmente, só veio através da perda de seus maridos. Embora aprecie a proposta, ela poderia ter sido mais bem executada tendo em vista que estamos em Chicago em pleno século XXI, em um contexto de lutas pelas mulheres mais efervescente.

Um outro ponto superficialmente explorado foi o da etnia, com a representatividade de parcelas da população usualmente vitimas de violência, como os latinos, os migrantes eslavos e os negros em conflito com os homens brancos que comandam a cidade. Embora a subtrama do longa, que envolvia a disputa para representante do 18o Distrito de Chicago tenha ficado à margem durante todo o filme, vindo a compor um desfecho muito duvidoso ao final, há aqui de se reconhecer a sua importância no que tange o enaltecer das tensões raciais entre a periferia e o centro do poder. Daniel Kaluuya, interpretando Jatemme, o braço direito de Jamal, Colin Farrell, interpretando Jack Muligan, candidato ao 18o Distrito, e Robert Duvall, pai de Jack e ex governante, conseguiram incorporar em suas estratagemas os traços que mais definem a relação entre os gêneros no longa: enquanto os homens lutam por poder, as mulheres lutam pela sobrevivência.

Por mais que subjetivamente o cenário fosse rico e interessante, a forma como se decide contar a história vai minando todo o bom trabalho dos atores. É muito difícil crer que 4 pessoas que nunca roubaram ninguém consigam realizar um assalto de grandes proporções e planejamento em sua 1a tentativa. E, além disso, é tão alto o nível de amadorismo na arte de roubar que inúmeros furos nos planos vão aparecendo, o que resultaria em suas prisões horas depois de crime ser denunciado ou até mesmo antes dele ocorrer.

Já ficando descrente sobre sua plausibilidade, eis que somos brindados com aqueles finais “não foi bem assim que aconteceu”, transformando todos os telespectadores em otários com aquelas cenas sob outra perspectiva de acontecimentos chaves da obra, ressignificando todas as suas 2h de duração.

Mesmo contando com algumas ótimas atuações e uma história que toca em alguns pontos sensíveis, As Viúvas foi um verdadeiro corta tesão. Tava tudo indo muito bem, com ótimas preliminares, com aquelas pessoas que você curte, mas aí acontece algo que acaba com todo o clima. Como resultado, ficou aquela sensação que poderia ter sido muito mais especial.

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