Crítica: A Pé Ele Não Vai Longe (Don't Worry, He Won't Get Far on Foot)
Dentre meus diretores favoritos – como você pode conferir em nosso Top 10 – Melhores Diretores em Atividade – encontramos Gus Van Sant, que conta em seu currículo obras não muito populares, mas de extrema sensibilidade, como “Elefante“, “The Sea of Trees” e “Milk: A Voz da Igualdade“, esse indicado a 8 Oscar em 2009, vencendo o de melhor roteiro original e melhor ator para Sean Penn.
Em seu novo longa, adaptando a autobiografia do cartunista John Callahan, A Pé Ele Não Vai Longe passa pelos momentos transformadores da vida do próprio, interpretado por um dos melhores atores de sua geração, o espetacular Joaquin Phoenix. Caso você, assim como eu, tenha entrado no cinema sem conhecer a história de John ou o seu trabalho, tenho certeza que levou tanto soco no estômago e tapa na cara que retornou para casa com vergonha de reclamar de qualquer coisa possível em sua vida.
Gus nos joga em diversos momentos no tempo em uma narrativa não linear, que explora os meandros sinuosos e cantos traiçoeiros que passamos pela vida. Em um desses momentos, ludibriados pelo alcoolismo, John e Dexter (Jack Black) acabam se envolvendo em um sério acidente de trânsito, causando paralisia severa em Callahan. Agora lutando contra seu corpo e sua psique, vemos nosso protagonista atingindo o fundo do poço quando encontra na amizade com Donny (Jonah Hill) e no relacionamento com Annu (Rooney Mara) um porto seguro. E eis que ele descobre na arte a sua cura, externalizando todos os seus demônios em charges carregadas de crítica social, humor negro, sátira, temas macabros e deficiência, enfrentando grande resistência do público, mas também recebendo admiração.
Mesmo não produzindo arte, já que me falta talento e um tanto de foco, é nela que eu encontro refúgio nos meus momentos mais sombrios durante minhas crises de ansiedade e depressão. A arte – no meu caso a música – possui um poder regenerador da alma, arrancando tudo de ruim que habita dentro de você e é nesse contexto que vemos a transformação de John. Embora esses demônios constantemente batam à nossa porta, ver como Callahan aprende a conviver com eles é o ponto alto do filme.
E não chegaríamos a ele sem as sólidas performances de Rooney Mara, que vem se mostrando competente e constante nos últimos anos, e de Jonah Hill, que desde “O Homem Que Mudou o Jogo“, eu babo um ovo forte. Contudo, mesmo com tempo de tela curtíssimo, o que foi o trabalho Jack Black? Em uma das cenas mais emocionantes do longa, a vulnerabilidade e honestidade do personagem me deixaram com um nó na garganta a ponto de querer ligar para todas as pessoas as quais fiz algum mal para pedir desculpas.
No mais, Gus Van Sant volta a arrastar nossa alma na lama com a adaptação da biografia de John Callahan, que, mais do que uma história de superação sem focar na autopiedade, mostra que somos apenas vítimas de nossos desejos. Certamente um dos melhores do ano.
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