Crítica: Pine Gap - 1a Temporada

“Dinheiro, ideologia, comprometimento ou ego”. Esses são os quatro motivos que justificam ações de traição ao longo dos tempos. Desde que existiu o primeiro traidor, perpassando toda a humanidade até hoje – e não deixando de lado, inclusive, o mais conhecido de todos – uma dessas palavras foi seu motivador principal. Este tema se torna ainda mais especial quando colocado no espectro internacional de disputa entre nações. Não à toa, por exemplo, o crime de traição à pátria é o único delito que prevê a punição de execução na Constituição brasileira. A nova série australiana da Netflix, Pine Gap, envereda por esta temática ao longo dos seus seis episódios de thriller, drama, investigação e espionagem.
Somos introduzidos a um grupo da inteligência de Pine Gap (uma base de espionagem americana em solo australiano, utilizada por ambos os países em longa aliança política – e isto é real, não ficcional), que busca investigar possíveis tentativas de ataques terroristas ou acordos secretos, através da vigilância plena de cada cidadão do mundo. Porém, começa a haver um racha dentro da equipe quando um ataque não impedido resulta na busca pelo autor. As primeiras suposições – que recaem, evidentemente, sobre o Oriente Médio em um primeiro momento – vão sendo deixadas de lado, ao mesmo tempo em que vestígios apontam para um espião dentro do próprio grupo. Cada um deles, portanto, vai sendo investigado pelos chefes da Base.

A narrativa estabelece duas linhas de desenvolvimento: o fato principal da investigação de cada personagem e a vida pessoal de alguns deles, conectando-se uma a outra. Dessa forma, o espectador começa a conhecer os dramas pessoais dos protagonistas, enquanto vê se desenvolver à sua frente um jogo de detetive que tenta enquadrar, a qualquer custo, um daqueles como principal suspeito. Essa estrutura, porém, é comprometida por um fraco desenvolvimento de personagens, sendo a maioria deles desinteressantes por natureza. Na verdade, uns até apresentam bons elementos caso fossem mais bem construídos, mas é exatamente a falta de aprofundamento de seus conflitos que vai fazendo com que a obra perca em interesse em seu todo. Em paralelo, o foco principal – a investigação do suposto traidor – cai nas velhas técnicas que revelam, em demasiado, a mão do diretor.
Cada episódio, para despistar o espectador, parece colocar deliberadamente um elemento que cause suspeita por parte de quem assiste à série, aumentando o leque de opções do procurado, em uma tentativa de suspense. Mas, em especial por isso, não funciona. Personagens antes pouco apresentados começam a surgir com mais atenção, como se cartas excedentes de um baralho colocadas à mesa como protagonistas de uma rodada-chave dos apostadores. Além disso, os personagens principais que poderiam ter seus conflitos melhor desenvolvidos perdem um pouco de espaço para uma trama que se revela pouco sedutora. Um dos momentos mais interessantes da série, porém, é o fato de sugerir como as alianças entre potências são realizadas em base tão sólida quanto a gota de uma chuva fina de verão; e como um país é capaz de produzir catástrofes a si mesmo para obter algum ganho proveniente de um auto-ataque (fazendo o sino do 11 de Setembro soar uma outra vez).

Sacrificando os momentos de tensão e suspense que poderiam ser orquestrados a partir do enredo apresentado, e, em seu lugar, promovendo sequências de conversas e mais conversas, Pine Gap é uma série com um ou outro período bom, mas deixando a desejar em sua maior parte. Histórias de investigação – ainda mais passadas em um centro tecnológico real – costumam produzir contos envolventes e estimulantes. Mas não é o que ocorre com esta produção, que tratou de relegar seus mais promissores elementos a segundo plano. O próprio pano de fundo – a delicada relação do povo local com a existência de uma base militar de inteligência de um outro país em seu solo – não emerge com determinada força nesse conto que parece encher de ingredientes sua receita, de modo a torná-la poluída em sabores, não se destacando nem um, nem outro.
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