Crítica: A Sereia: Lago dos Mortos (Rusalka: Ozero Myortvykh)
Para alguém já rumando aos 40 anos e com idade mental de 15, como a pessoa que vos escreve, as sereias povoam seu imaginário como seres adoráveis, gentis e atraentes. Não é pra menos, vide que durante o final dos anos 80 e início dos 90 os longas “Splash: Uma Sereia em Minha Vida” e “A Pequena Sereia” martelavam nossas cabeças na Sessão da Tarde da Globo. De lá pra cá, contudo, parece que a fonte secou e não me recordo de qualquer outra obra envolvendo pessoas metade peixe metade humano. Isso até 2018, quando revisitei nossos amigos do mar na série estreante da NETFLIX, “Tidelands“, que, mesmo contando com um certo hype e a presença de um ator brasileiro, acabou morrendo na praia (Rá!). Também no mesmo ano – mas apenas chegando agora às praias brasileiras (sim, ficarei fazendo referências e piadas merdas sobre mar até o final) – o cinema russo, esse país com belíssimas e conhecidas praias, resolveu dar uma repaginada no mito com pitadas de terror. Será que acertaram no tom?
Não, não acertaram. Porém, antes de esculhambar com o filme, é importante ter em mente que o ser mitológico sereia é muito antigo e nem sempre ele foi retratado como a versão clássica que temos hoje no imaginário das massas, com a parte inferior do corpo de peixe e a superior de humano, sendo geralmente uma mulher. Dito isso e olhando para o material de divulgação, fica evidente que não será um longa com abordagem convencional no que tange ao popular.
Começamos com aquela narração explicando o lore “sereial”, entrando em alguns detalhes pertinentes, como o de esses seres deixarem a pessoa doente/obcecada e só largarem o osso quando ou sujeito se entregar ou entregar a pessoa que mais ama, com a demonstração empírica naquela clássica cena de algo dando errado e que sabemos que voltará lá para o final da obra para um final “cartático”, com o pai de Roma Kitaev (Efim Petrunin) – nosso protagonista nadador profissional – sendo atacado por algum ser dentro de um lago, mas escapando enquanto sua esposa é levada.
Alguns anos depois, nessa mesma casa do lago, meio que está acontecendo uma despedida de solteiro para Roma enquanto sua namorada, Marina (Viktoriya Agalakova), está na cidade em seu apartamento em processo de reforma. Óbvio que Roma encontra com a sereia e começa a ficar galudo, mas diferente do costume, ele é que passa a ser “stalkeado” pela entidade. É aí que o filme se perde fodamente, sendo mais uma obra sobrenatural de espírito demoníaco do que algo remotamente que lembre uma sereia. Além de se passar em água doce em um lago bem modesto, a maior parte dos momentos de aparição se dá longe do lago ou de qualquer grande corpo d’água, incluindo aparições em locais completamente secos. Eu não preciso nem falar que essa sereia tem pernas, né?
Mesmo contendo efeitos visuais muito decentes, assim como maquiagem, a ambientação peca um pouco, não criando aquela atmosfera instigante e original, parecendo qualquer outro filme de espírito qualquer. Completando o pacote genérico, temos jumps scares a torto e a direito e decisões super questionáveis quanto a sua eficácia tomadas pelos personagens. Um vez que você se acostuma ao pós-terror – como está sendo chamada essa nova leva de bons longas do gênero (confira a crítica de “Hereditário” para entender mais a respeito) – fica difícil extrair algum prazer desses subterfúgios rasos para arrancar sustos.
Parecendo uma fã do Kiss e da música “Do You Love Me?”, que é essencialmente a única frase que a sereia sabe falar, e horrorosa, sendo eu aqui um pouco porco chauvinista, ela falha miseravelmente em ser crível tanto do ponto de vista mitológico quanto como assombração, sendo despida de qualquer background interessante. Para piorar algo que já estava ruim e que até poderia redimir um tanto a película, temos um final completamente incompreensível com um ritual tirado da bunda. Será que drenar o lago ou jogar chumbinho na água era tão difícil de pensar assim?
Enfim… Temos em A Sereia: Lago dos Mortos mais uma bela duma cagada do pessoal do marketing, direcionando o longa para uma audiência que está indo com uma expectativa bem diferente do produto que será recebido, e, mesmo se fosse apropriadamente direcionado, ainda assim seria um longa mal executado e que fez a sua 1h30mim parecer 3 horas. A Ariel chora.
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