Crítica: Durante a Tormenta (Durante la Tormenta)
Semana passada, diretamente da Catalunha, a Netflix lançou a série “Se Eu Não Tivesse Te Conhecido“, que trata sobre uma espécie de viagem no tempo e seus universos paralelos. Esta sexta, saído do mesmo lugar, temos Durante a Tormenta, seguindo essa mesma temática: a necessidade que o ser humano tem de superar o destino, ou algo que o valha, para tentar a seu modo consertar as coisas.
Separadas por 25 anos, duas tormentas ligam personagens desses momentos distantes no tempo, mas não no espaço. Em pleno contexto mundial da queda do muro de Berlim, um garoto descobre um crime na vizinhança, que o leva a ser atropelado e consequentemente perder a vida. No nosso presente, Vera (muito bem por Adriana Ugarte) consegue se comunicar com este menino através das televisão e câmera antigas dele, presentes na mesma casa agora habitada pela protagonista. A justificativa pouco científica (mas não há qualquer crítica nessa fala) é trazida pela tormenta, que consegue de alguma forma uni-los através das imagens produzidas no mesmo local, como uma videoconferência ao vivo, ainda que separados por mais de duas décadas. O objetivo dela é salvar a vida do jovem rapaz, mas isso acarretará em mudanças bruscas na sua vida.

A personagem desse conto catalão sentirá a mesma noção de efeito borboleta e as contradições que a existência de uma espécie de viagem no tempo, ou abertura de possibilidades de mudanças de um passado por um indivíduo do presente (ou futuro se comparado ao tempo original da narrativa), produzem. Partindo do mesmo pressuposto da série supracitada, o diretor e roteirista Oriol Paulo (com sua dupla Lara Sendim) investe nos detalhes da vida que geram realidades completamente distintas; como se simples decisões pequenas pudessem afetar como um todo os caminhos de alguém, numa prova de que as ações do ser humano, em uma tentativa vã de burlar o destino, fossem meras iniciativas que só resultam em novas conclusões desse mesmo destino. Além disso, mostra que alguns casos permanecem imutáveis, como se a vontade soberana e definidora estabelecesse aquele mesmo fato independente das suas alterações.
A angústia de vidas que se transformam, mantendo-se as lembranças daquelas que não deveriam mais existir, funcionam muito bem no gênero de drama investido pelo diretor, aprofundando mais essas sensações e sentimentos do que caindo na esfera do sci-fi. Para além disso, os momentos do crime ocorrido naquela fronteira entre as décadas de 1980 e 1990 são devidamente explorados como um thriller, conseguindo dialogar entre os estilos sem se perder na proposta. No entanto, alguma obviedade da narrativa – para espectadores que tentam desvendar a trama que se desenvolve – poderia condená-la; mas o caráter que, para alguns, se apresenta como óbvio pode ser entendido de maneira conceitual, isto é, como o destino fazendo o seu papel naqueles elementos que se mantém imutáveis, independente das alterações de passado-presente-futuro.

Histórias como essas são, por natureza, instigantes, já que colocam (e tentam responder) questões pensadas por praticamente todos os seus espectadores. É sedutora a ideia de poder mudar o que passou, mas o castigo imposto pela pergunta de como tudo seria se mantém inabalável. Imaginar-se a si mesmo como controlador do destino é uma tarefa para além do narcisismo, mas, no duro, é exatamente isso que é o ser humano: animais que se vêem como semi-deuses, sem perceber a falta de super poderes que tem.
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