Crítica: Operação Fronteira (Triple Frontier)
O roteirista e produtor Mark Boal é uma figura única em Hollywood. Todos os filmes que ele escreve e/ou produz, sejam eles bons ou não (e em geral são excelentes), costumam estar carregados de um comentário social em geral direcionado a América e sua mania de não só querer ser a polícia do mundo, mas também a necessidade de se criar gerações e gerações de máquinas de combate humanas justamente para que isso seja possível. Foi assim em sua estreia com o excelente “No Vale das Sombras”, continuou assim com o estupendo e oscarizado “Guerra ao Terror” (pelo qual ganhou Oscar de melhor filme como produtor e melhor roteiro como roteirista) e com “A Hora Mais Escura”, chegando agora a esse “Operação Fronteira”. Desta vez ele assina o roteiro em parceria com o diretor do longa, J.C. Chandor, um sujeito que nunca fez um filme que não fosse pelo menos bom, com destaque absoluto para o excelente “Margin Call”.
A filmografia de ambos tem em comum a tensão absoluta que suas narrativas imprimem no espectador a cada segundo de exibição, seja no Afeganistão com o desarme de uma bomba, seja em um edifício espelhado numa Wall Street à beira de um colapso financeiro. Em Operação Fronteira isso não é diferente, mas, para além disso, aqui a intenção de ambos é entregar um filme de assalto que ao mesmo tempo tem crítica social e ação. Ocorre que, ainda tenha uma produção vistosa, ele às vezes se perde em meio a tantas intenções, esvaziando o desenvolvimento dos personagens. Isto não impede o longa, contudo, de ser uma sólida peça de entretenimento e de fazer um convite claro e pertinente a uma reflexão sobre a fábrica de assassinos profissionais que são as forças armadas americanas. Ahh, tem também a impagável (para nós brasileiros) cena da galera tomando Brahma e Antarctica que por si só já vale as pouco mais de 2 horas de filme.

Operação Fronteira começa com aquela que talvez seja sua mais densa e dramática cena. Ironhead (Charlie Hunnam) é um ex-agente fodão de algum braço das forças armadas americanas que está narrando algo que ocorrera cinco anos antes, quando ele, já reformado e indo ao mercado com sua noiva, cometeu um ato impensável justamente porque foi àquilo que ele foi condicionado a vida toda. Ele foi criado e treinado para ser um guerreiro. É só isso que ele sabe fazer, é só fazendo isso que ele se sente vivo e é a certeza de que não há lugar para gente como ele em uma terra que não está em guerra que jaz toda a melancolia de sua fala. Afinal, para que serve um guerreiro quando não há uma guerra a ser travada?
É este o grande comentário social que o filme traz, criticando o quase absoluto abandono que essas pessoas treinadas para matar pelo país e pela liberdade sofrem por seus governos quando deixam de ter sua utilidade enquanto as máquinas de matar que foram criados para ser. Ainda que esta questão seja relativamente rasa, ela é recorrente ao longo de todo o filme e é explorando esses sentimentos de abandono, injustiça e ressentimento por tudo aquilo que estas pessoas são levadas a fazer pelos ideais de outrem que Pope (Oscar Isaac) consegue convencer seus colegas de outrora a praticar um assalto multimilionário no qual, finalmente, todas as habilidades dos cinco poderão ser usadas plenamente e em benefício próprio, não o de terceiros.
Pope é o único dentre todos que continua tendo na guerra seu ganha pão. Após se aposentar, ele se tornou um mercenário (ou consultor) em algum lugar do que parece ser a Bolívia. Lá ele passou anos atrás de um traficante sinistrão que aparentemente manda no tráfico de drogas de toda a região. Após descobrir que este malandrão está escondido em uma casamata no meio da floresta, ele resolve usar essa informação para si mesmo e recrutar as pessoas com quem forjou o laço de amizade com fogo e sangue que só a guerra é capaz de forjar para matar o cara e roubar os muitos milhões de dólares que ele tem consigo. Para tanto ele conta com a liderança de seu ex-capitão Redfly (Ben Affleck) e a ajuda de seus colegas, Ironhead, Ben (Garret Hedlund) e Catfish (Pedro Pascal).
Infelizmente, à exceção dos personagens de Affleck e Isaac, os demais praticamente não têm qualquer profundidade ou desenvolvimento. E até mesmo estes dois não têm assim lá um arco dos mais desenvolvidos, mas tão somente o suficiente para que as motivações e circunstâncias da obra se justifiquem, trazendo aqui mais uma crítica à ganância desmedida da qual todo ser humano é capaz e parece ser algo ainda mais forte e intenso na sociedade norte-americana.
Por outro lado, apesar de um tanto rasas, as críticas sociais são pertinentes e não soam nada forçadas neste que é, essencialmente, um filme de assalto com ação bem orquestrado e competente, conseguindo criar tensão nos momentos-chave em que a tensão tem que ser criada e apresentando cenas de ação que se mostram bem cativantes em seu propósito.
Adicionou-se a isso ainda um uso deslumbrante de uma cinematografia corretíssima – valendo-se das lindas paisagens andinas e selvagens para fazer o contraponto relevante entre a civilização nefasta e a pureza da natureza – e uma trilha sonora que cai como uma luva dentro da ação (foi o melhor uso de “For Whom the Bell Tolls” do Metallica desde 1987).
Assim, mesmo sendo raso na sua proposta de criticar e no desenvolvimento de alguns personagens, Operação Fronteira é um filme acima da média, com muita tensão e uma ação muito bem executada pelo seu quinteto bem azeitado de protagonistas, conduzido por um diretor que sabe perfeitamente o que está fazendo e baseado num roteiro que, se não é brilhante, cumpre bem aquilo a que parece se propor.
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