Crítica: Brightburn - Filho das Trevas (Brightburn)
Desde quando eu li “Superman – Entre a Foice e o Martelo” e “O Reino do Amanhã”, o primeiro situando o kryptoniano na URSS desde sua chegada à Terra e o segundo transformando seu caráter após uma série de acontecimentos catastróficos, fiquei imaginando situações hipotéticas onde seres superpoderosos e indestrutíveis tivessem uma forma menos altruísta de encarar o mundo. Quais seriam as implicações psicológicas de uma mente de um ser onipotente perante uma sociedade impotente à sua vontade? Batman estava certo? Se houver a menor chance dele ser uma ameaça deveríamos matá-lo? Alguns bons filmes e obras literárias já exploraram o assunto, talvez com “Watchmen” sendo um dos expoentes ao retratar o Dr. Manhatan perdendo a conexão com o mundo ao ponto de achar a vida em si insignificante. Mas o que sempre quis saber, e que Brightburn – Filho das Trevas responde com maestria, é: e se o Superman fosse mau?
Como você pode verificar pelo trailer, essa é uma releitura da história do homem de aço. Tamanha é a sua influência aqui que o longa mal perde tempo em sua origem, tomando como certo o seu conhecimento dessa história mais do que batida e dos meandros que o levam a descobrir seus poderes. Além disso, todo o cenário é IDÊNTICO e inúmeras referências são feitas sutilmente, como a capa que Brandon (Jackson A. Dunn) usa que é o mesmo pano que o envolve quando bebê ao chegar à Terra, até explicitamente, como a fazenda onde ele cresce passando por situações semelhantes. Essencialmente, a história do longa é o amadurecimento de nosso protagonista mudando de um garoto criado como terráqueo, para um semi-deus alienígena emocionalmente desconectado do mundo.
Por funcionar em cima de tudo o que já foi construído com Superman, temos um roteiro precário no que tange ao ritmo e que carece de desenvolvimento de alguns personagens. Fica claro o descompasso de seu ritmo no seu primeiro terço, onde temos apenas uma sucessão de cenas corridas que levam Brandon a sua condição sociopata. Brightburn é um filme de 1h30 que se beneficiaria de 30 min a mais para desenvolver melhor a personalidade de seus personagens. O roteiro também peca ao ignorar questões envolvendo a polícia que com toda a certeza, mesmo no departamento mais incompetente, chegaria até Brandon muito antes do que ocorre no longa. Essa opção de atrasar seu embate com a lei para deixar seu desenvolvimento emocional na base familiar até compensa em seus momentos derradeiros, mas machuca um tanto a narrativa. E, embora tenha gostado, o que desencadeia o lado violento de Brandon é um artificio preguiçoso, mas ainda assim interessante por deixar perguntas a serem respondidas e que abrem oportunidades interessantes do ponto de vista ético e moral. Será que um dia dependeremos dele para salvar o planeta? Essa é uma resposta que, dado o final, talvez venhamos a saber a resposta.
Tecnicamente Brightburn não fica devendo. É um filme muito violento e que mostra explicitamente cenas visualmente fortes com requintes de crueldade. Você já imaginou o que aconteceria se Superman usasse sua visão de calor na cara de alguém? Bem… você mataria a sua dúvida. Aqui há mortes para todos os gostos e explorando todos os poderes e situações possíveis que um ser com esses poderes pode ter. Além do mais, com um ciclo – movido por aquele artifício preguiçoso – de dia, com Brandon em seu cotidiano, e noite, com ele na identidade velada de Brightburn, criam momentos de tensão muito bons. Nunca imaginei que ver uma criança com uma máscara tenebrosa flutuando do lado de fora de uma janela com olhos vermelhos brilhando enquanto sua vítima impotente se caga de medo era algo que eu precisava. Aliás, muitos detalhes espelhados e com alternância permeiam a história. O seu logo, por exemplo, com dois “B”, sendo um espelhado no outro, refletiu a sua própria identidade. BB pode ser tanto Brandon Breyer como Brightburn. Outro desses detalhes é a máscara para esconder sua identidade ao usar seus poderes, enquanto o Superman esconde sua identidade ao fingir que é terráqueo. Essa é a tônica do filme, mostrar Brandon como a versão espelhada de Clark.
A atuação de todo o núcleo Breyer, único que vale acompanhar, carrega o longa. Tori (Elizabeth Banks), como uma mãe que tenta proteger sua cria, ignorando todos os alertas, contrasta com seu marido Kyle (David Denman), que a todo momento suspeita que as origens de seu filho é a responsável pela mudança em sua postura, levando os dois a uma rota de colisão com um resultado ao mesmo tempo esperado e surpreendente. Jackson A. Dunn, o Brightburn, conseguiu externalizar a mentalidade ainda em construção de um pré-adolescente de 12 anos que não tem qualquer restrições sociais e físicas para fazer absolutamente o que quiser e entregou uma performance realmente digna. Ele conseguiu me fazer sentir um pesar genuíno no momento da ruptura final de Brandon, quando o último fio que o mantém ainda ligado à humanidade se perde.
Fazia tempo que eu entrava no cinema com expectativa altas e saía satisfeito, talvez até eufórico, querendo conversar com alguém sobre toda essa insubordinação com algo estabelecido. Apresentando um final que subverte cenas clássicas de filmes de heróis, ficamos com as portas abertas para novas entradas nessa franquia que, ao que parece, inaugura um novo universo. Aguardo ansiosamente pelo desenrolar de sua história.
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