Crítica: I Am Mother
I Am Mother é a mais recente entrada da NETFLIX no gênero sci-fi e abre um leque de temas que nós – cinéfilos nerds que ultra-analisam cada diálogo e objeto em cena – amamos discutir. Contudo, sendo esse um filme que se faz em cima de alguns mistérios e que depende da nossa ignorância para funcionar, além dessa crítica não conter spoilers das partes sensíveis, não busque aqui por respostas e teorias de partes que ficam dúbias ou sequer são trabalhadas na obra, embora eu queira saber o que vocês acharam desse final aí nos comentários.
Começamos já largados no escuro do saber, no dia de algum evento apocalíptico que está acontecendo na superfície terrestre enquanto em um bunker um robô, a Mãe (Rose Byrne), está sendo ativado para começar a repopular a Terra colocando 1 dos milhares de embriões lá presentes numa câmara de gestação (que aqui leva perto de 24h para dar a luz). Alguns anos depois conhecemos a Filha (Clara Rugaard), que está sendo preparada para a realização de mais um dos muitos testes que fez no decorrer de sua vida. Eis que um dia chega à porta do bunker a Mulher (Hilary Swank), que está baleada e precisa de atendimento médico. Começa aqui um jogo de manipulação que a cada cena vai te deixar em dúvida da origem e índole de cada uma das 3 personagens.
A chegada da Mulher adiciona questões centrais para o desenvolvimento do roteiro. A mais importante e que será o ponto de ruptura é: como existem seres humanos lá fora, já que o mundo, supostamente, foi varrido por uma contaminação que dizimou o homo sapiens? Quando percebemos que a Mãe está mentindo para a Filha e que seu comportamento protetor ganha contornos macabros e investigativos, o longa, que até ali vinha em um ritmo lento, ganha tensão. Foram diversos momentos que o intuito inicial que nos é passado da construção da Mãe ficou em cheque. Por que ela quer saber exatamente de onde a Mulher veio? Por que ela mentiu sobre o mundo exterior? Quem construiu esse robô e o bunker? É em cima desses questionamentos que seremos conduzidos por revelações – ora esperadas, ora nos acertando do nada – sempre bem apresentadas e conduzidas pelas atuações consistentes da Rose Byrne, numa dublagem que, mesmo não marcando os anais da inteligência artificial, nos desperta empatia por uma máquina que está aprendendo tanto quanto está ensinando, e da Hilary Swank, encarnando uma sobrevivente paranoica que sabe (ou acha que sabe) a real intenção da Mãe. Infelizmente não posso falar o mesmo de Clara Rugaard, que peca ao criar conexão tanto com o telespectador quanto com as duas outras personagens, servindo mais como um meio para a disputa entre elas.
Aquela manjada discussão sobre a inteligência artificial e a proteção da humanidade aparece aqui permeada por diálogos filosóficos e detalhes pequenos – e eu fortemente recomendo que você preste muita atenção neles – que, após algumas das questões supracitadas serem respondidas, ganham uma recontextualização e transformam o terço inicial lento do filme em algo a ser revisitado e apreciado sob um novo olhar. Embora tenha algumas ressalvas quanto a lógica que move a Mãe e da origem da Mulher que o longa dá a entender em um final bem acima da média, temos um sci-fi que consegue entregar uma história instigante e sem contradições. Se você curte obras como “Ela”, “Eu, Robô”, “Horizon Zero Dawn” e “Matrix” – todas muito diferentes em suas gêneses e que encontram aqui um nó onde se unem – I Am Mother é um ponto de parada obrigatório.
Tecnicamente, mesmo não tendo um escopo amplo no que tange à narrativa, com seu desenvolvimento se passando quase que exclusivamente dentro do bunker, a produção conseguiu criar um ambiente rico e imersivo, com bons efeitos visuais e cenários que nos transportam para dentro daquela realidade tecnológica pós-apocalíptica.
Mesmo não sendo um filme que discute a ética e a moral da existência da uma inteligência artificial como no excelente “Ex Machina” e também não sendo aquele blockbuster repleto de ação a la “Exterminador do Futuro”, I Am Mother encontra seu equilíbrio em um meio termo entre o sci-fi para as massas e aquele direcionado para os que gostam de achar em detalhes e perguntas não respondidas significados que vão muito além daqueles apresentados no longa.
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