Crítica: Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal (Extremely Wicked, Shockingly Evil and Vile)
Antes de começar a análise específica desse filme, preciso deixar claro ao leitor o tamanho da minha expectativa por esta produção. Não por qualquer interesse na figura de Ted Bundy, o conhecido psicopata, apesar de minha curiosidade acerca da temática ser sempre enorme; não porque havia ouvido falar isso ou aquilo sobre a obra, mas única e exclusivamente por ser, ao meu ver, um raro momento em que o excelente – excelente mesmo! – ator Zac Efron fora levado mais à sério e escolhido para um papel complexo, forte e impactante. Portanto, desde que soube de sua escalação para encarnar um dos maiores animais da História, a expectativa foi enorme. Precisava ver na tela como se sairia esse rapaz por quem tenho tanto apreço e a quem defendo com unhas e dentes quando das risadas calorosas a que sou submetido ao assumir a admiração pelo artista. Tendo dito isto, vamos às palavras exclusivamente direcionadas à produção.
Dirigido por Joe Berlinger, que também assume a autoria da série documentário lançada na Netflix “Conversando com um Serial Killer: Ted Bundy” (como o título nos mostra, focando na mesma figura), Ted Bundy: A Irresistível Face do Mal conta a história do terrível e sedutor psicopata em uma perspectiva mais próxima de sua vida comum do que a que marca a sua essência abjeta. Mais do que tudo, somos colocado dentro de seu relacionamento apaixonado com Liz Kendall (em grande performance de Lily Collins), pessoa que, supostamente, Bundy realmente amou (se isso é possível a mentes desse tipo). Do início de seu namoro às suspeitas que começam a recair sobre ele, acompanhamos a visão de Liz e Ted, que insistem em sua inocência. Não há uma cena – uma sequer, em quase todo o filme – de Ted se preparando para atacar; de Ted maquinando seu próximo passo; de Ted descontrolado para realizar os atos pelos quais sua persona tem sido eternizada em um sem-número de obras, literárias ou audiovisuais. O que vemos aqui é uma sequência enorme de julgamentos e prisões (fugas e novos encarceramentos) a que Bundy foi submetido. E tudo isso tendo como pano de fundo seu amor irrestrito a Liz, que, por sua vez, não consegue esquecê-lo. Só a Verdade a libertará. Mas qual é a verdade?

É perfeitamente cabível uma história que assume uma proposta bastante diferenciada do comum quando do mergulho nesta temática. Joe Berlinger parece não querer recair no velho filme thriller de psicopata, de caça e presa (seja por parte dele e a polícia; seja entre ele e suas vítimas); o diretor deixa de lado tudo o que marca as ações de Ted Bundy, para analisá-lo em uma perspectiva de Liz, que de nada sabia, a não ser o que traziam os noticiários e a polícia – sempre colocados em cheque em relação às falas inocentes de seu amor. Como poderia aquela pessoa que jamais levantou a voz para ela, que jamais agiu com rispidez, que sempre fora cuidadoso para com ela e sua filha, ser tudo aquilo que a mídia insistia dizer?! Tal como ela, o espectador passa a acompanhar esse mesmo viés da narrativa: o que se mostrava ser Ted e o que os outros diziam o que ele era. O homem sedutor e bonito versus um monstro inconcebível, que estuprava, esquartejava e se esbaldava em puro sadismo. “Extremamente Perverso, Escandalosamente Cruel e Vil”, como dissera o Juiz olhando em seus olhos (e que é a tradução livre e literal do título original do filme).
A escolha de Joe Berlinger por fazer um filme deste tipo, com tamanha figura, é louvável. De fato, é! Mas isso tem suas consequências. A primeira é que a produção, por vezes, parece um filme de romance, com trilha sonora que endossa essa atmosfera, soando desrespeitoso para com a história das vítimas (mas isso não é um pecado; é apenas uma perspectiva). O maior erro, porém, no que diz respeito à narrativa é o fato de que o filme se torna uma história de julgamentos, sem focar em demasiado nas sessões da Justiça. Logo, reduz-se a um apanhado de cenas de romance com julgamentos, dando muito pouco de tensão e expectativa para com os caminhos deste conto. O veredito já sabemos, de antemão; além destas sequências não promoverem aquele suspense abordado em obras desse estilo. O título, então, nem é um romance, nem filme sobre Justiça, muito menos sobre psicopatia. Ele fica em um limbo narrativo, que pincela e esboça certos temas, mas não emplaca em nenhum. Paira pelo ar, meio que perdido em tantas premissas.

Outro erro dessa escolha recai sobre o dito na introdução. Ao se decidir por falar sobre Ted Bundy, mas não em sua essência psicótica, vil e chocante, mas na perspectiva de um homem comum (que fora capaz de cometer os atos absurdos, aos quais temos contato apenas via mídia dentro do próprio filme), tira-se muito do grande material que Zac Efron teria para trabalhar. Ou seja, o roteiro esvazia a enorme complexidade que Zac poderia lapidar, entregando a ele um papel de uma pessoa comum, a priori julgada erradamente, mas que não carrega em si nada muito além disso. Não há dúvidas, porém, que o trabalho de Efron é excelente, é preciso, é forte. Mas aquela minha expectativa inicial fora traída pela escolha narrativa (completamente louvável, repito) do diretor. De todo modo, este título mostra que eu estava certo. Assim como estava com Matthew Mccanaughey, quando este só fazia filme vagabundos de romance; ou com Casey Affleck, quando ninguém dava um papel minimamente bom para o rapaz. Eu sempre dizia: dê algo sério a eles e eles ganharão um Oscar. Assim ocorreu. O mesmo repito para Zac Efron. O dia em que esquecerem que ele foi o galãzinho de High School Musical e levarem à sério o grande ator que é, não tenho dúvidas que será prontamente indicado pela Academia.

Apesar de uma intenção narrativa que busca sair do comum, a direção da obra se perde em meio às suas várias tentativas. Perde o que de mais interessante esta história poderia trazer e não se decide no que é, em sua essência. Infelizmente, não é perversa, não é cruel, não é vil. É comum e sem complexidade. É exatamente a face que Joe quis mostrar de Ted. Mas é exatamente o que ele não era.
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