Crítica: Jogo na Escuridão (Game Over)
Antes de começar a falar sobre Jogo na Escuridão, seria interessante pensarmos sobre o fato de que, apesar de Hollywood ser dona de 60% da renda da indústria cinematográfica mundial, a indústria cinematográfica indiana, que tem um papel forte na cultura de lá desde a década de 1940, ainda é a única capaz de rivalizar com a americana. Tendo a Índia uma produção de 1000 filmes por ano, uma média de mais de 80 filmes por mês, isso me faz pensar que, por haver uma rotatividade absurda de filmes no mercado, talvez alguns não sejam feitos com tanta preocupação e a coerência dos roteiros se torne irrelevante. Acredito que seja o caso do longa em questão.
A cena de assassinato macabro que dá início ao filme que tem Game Over como título original nos traz a impressão errônea do longa-metragem, afinal você não está prestes a presenciar um terror, longe disso, sendo mais claro, essa é a única cena em que há terror. Durante uma hora de filme o espectador é presenteado com muitos momentos de choro, ataques de pânico, sessões de terapia que foram iniciadas após um trauma sobre o qual temos pouquíssimas informações e tentativas falhas de suicídio, ou seja, zero terror, um pouco de suspense, quase nada.
Swapnam (Taapsee Pannu), nossa protagonista, que, apesar de ser uma designer de games (informação que só temos porque está na sinopse) e dizer em uma de suas idas ao psicólogo que tem muito trabalho acumulado, não é vista trabalhar em momento algum, isso porque faz home office e 70% do enredo se passa em sua casa – vemos apenas cenas onde seu vício por jogar pac-man fica evidente -, declara que desde o belo dia em que decidiu fazer uma pequena tatuagem no punho sua vida desmoronou. Mas eis a pergunta: o que caracterizaria esse “desmoronar”? Além de uma ida à cafeteria onde dois sujeitos desconhecidos a reconhecem e começam a rir de suas fotos na internet, sua rotina não explicita isso. Aliás, o que leva duas pessoas a rirem de uma mulher amordaçada no chão? Seriam eles os responsáveis por sua noite de tortura? Kalamma (Vinodhini Vaidyanathan), sua cuidadora, menciona que a pessoa responsável por esse crime está na prisão, ou seja, mais uma pergunta sem resposta. Sabemos que ela tem um trauma, devido a um evento que aconteceu no último ano novo, no entanto não temos detalhes, um ou dois flashes de memória de sua suposta tortura, mas como ela teria escapado? O que a tatuagem significa e tem a ver com isso? Por que ela se isolou do mundo, não fala com os pais e não quer vê-los? Por que ela não permite que seu quarto seja arrumado? Ok, podemos relacionar a bagunça do cômodo com sua confusão mental revelada ao longo do filme, sim, mas essa e outras perguntas provocam um excesso de informação desnecessária, pois não trazem profundidade à história e geram um cansaço no espectador, já que nada disso é respondido e passa a impressão de descuido na direção e/ou no roteiro.
Em um determinado momento do filme, temos a ciência de que sua tatuagem tem relação com a menina morta no início do filme. As cinzas da vítima, que teria vencido um câncer três vezes antes de ser decapitada e incinerada, foram misturadas na tinta da tatuagem de Swapnam por descuido (como assim?) o que seria usado em um tipo de “tatuagem memorial”. As dores fortes que Swapnam sente no punho com frequência funcionam como uma espécie de aviso, sua hora também vai chegar. Uma vez que ela precisa vencer seus demônios, teria ela ajuda desse espírito? No fim das contas, o assassino a encontra e a história toma um rumo estilo “Corra Lola, corra” onde a protagonista têm três chances para se salvar. A essa altura, mesmo com essa quantidade de spoilers você não deve ter entendido metade da história. O suspense psicológico indiano todo é muito confuso e insatisfatório ao tentar emitir sua mensagem principal, que talvez seja a necessidade de vencermos nossos demônios. Talvez.
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