Crítica: Meu Amigo Alexis Sánchez (Mi Amigo Alexis)
Ahh, o futebol. Poucas coisas são tão maravilhosas quanto o futebol. Capaz de levar alguém do céu ao inferno e de volta ao céu em questões de segundos. Responsável por um fanatismo quase impensável, o futebol é como um universo de fantasia colocado em um mundo real. Na estréia semanal da Netflix, o lançamento de Meu Amigo Alexis Sánchez consegue unir pureza, poesia, delicadeza, sonhos, reflexão e… futebol em uma obra cativante, com várias discussões e suas camadas de profundidade colocadas à mesa.
Tito (em atuação no tom de Luciano González) é um garoto que mora com sua família em uma comunidade. Seu pai, ex-futebolista, é um daqueles progenitores que joga para sua cria tudo aquilo que queria ser, mas não conseguiu. Carregando seu fardo de frustração, o pai de Tito projeta no menino toda a expectativa que tinha para si e que nunca se concretizou: ser um jogador de futebol. Acontece que Tito é um fenômeno das pracinhas junto com seus amigos, naquelas peladas das tardes que estão no dia-a-dia de qualquer boleiro. Acontece também que Tito só pensa em futebol enquanto diversão, mas o pai insiste em lançar o garoto aos grandes clubes locais. Em uma obra do acaso, ele conhece seu grande ídolo – e ídolo de todo o Chile, diga-se de passagem – Alexis Sánchez, o qual passamos a conhecer mais profundamente ao acompanhar sua história de criança, 20 anos antes, nos campos de extrema pobreza de Tocopilla.

Enquanto Tito vive com os dramas de um pai machista e dominador, que obriga o filho a ser aquilo que quer, mas que não dá atenção à filha que é um mito nos gols dos mesmo campos de concreto onde as peladas são jogadas (essa, sim, sonhando em ser uma jogadora de futebol), a inimaginável amizade com o astro Alexis começa a ser construída e este passa a se tornar um amigo do menino, sendo seu principal conselheiro. À medida em que Tito vai, junto com Sánchez, trabalhando seus problemas e encontrando soluções para sua vida, Alexis vai revisitando a vida dura que teve, muitas vezes sem ter o que comer, e lembrando como utilizou isso para se tornar tão mais forte e renovar seus votos de superação diariamente. Você poderia até imaginar que se trata de um clichezão. Mas, querido, no futebol não há clichés (ou o futebol só é cliché – mas isso não interessa) e a relação de amizade tão pura que se desenvolve, juntamente com a construção tão carismática do célebre atacante da Roja (é necessário dizer que a atuação do goleador é marcante, cativante e tocante), é o bastante para você parar de pensar se a história é ou não trivial, lugar-comum ou qualquer coisa que pense para denegrir. Simplesmente, não cabe. Como se um “Cinema Paradiso” com Totò e seu amor incondicional ao Cinema, aqui temos um Tito e seu amor incondicional ao ícone do futebol de seu país. Quem nunca viveu um encontro desses em imaginações que voavam pela infância de um boleiro wannabe?
Do ambiente extremamente sexista que o futebol manteve até aqui, da construção de uma família-padrão onde o pai poda as asas de um filho, da relação pura de amigos, aos sonhos que jamais poderiam ser palpáveis, mas que se tornaram realidade: tudo isso está presente nas pouco mais de 1h30 de filme. E tudo isso tendo como paralelo uma história ficcional (mas que, na realidade, é a história real de quase todos os garotos) e uma história real (que tem toda a cara de uma história ficcional, do sonho que deu certo). O menino de Tocopilla, que ganhou os corações de Londrinos, que jogou ao lados do melhores no Barcelona, que venceu a América duas vezes seguidas. Aquele conto que todos imaginam para si, mas que só acontece a poucos. Uma ode a um dos maiores ídolos do Chile, em uma sinfonia harmoniosa que homenageia todos os garotos e garotas do mundo. Quem não sonhou em ser um jogador de um futebol? – canta a música. Tudo na medida, sem querer deliberadamente ser tocante, sem soar piegas, sem incorrer em soluções que colocariam tudo a perder. A simplicidade – assim como presente nos campos da pobre Tocopilla – fala mais alto que qualquer ensaio de crítica que se possa fazer.

Ahh, o futebol. O sonho. O Cinema. Os desejos de garoto. A vitória e o sorriso ingênuo de uma criança (aqui representado por Marco Baeza interpretando com plenitude Alexis criança) que puderam dar a nós o gosto doce de saber que histórias aparentemente hollywoodianas também acontecem. A redenção não é um cliché. A redenção é uma possibilidade que todos temos. Alguns escolhem não optar por ela. Outros se constroem nela. Meu Amigo Alexis Sánchez é um filme delicioso, puro para corações puros, como os sonhos devem ser.
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