Crítica: Luna

Numa rápida pesquisa por sites de notícias, observamos dezenas de casos de jovens que tiram a própria vida levados pelo desespero e humilhação provocados pelo famoso cyberbullying, que aparece como um dos temas centrais do longa de Cris Azzi, Luna, lançado em 2018 na 51ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.

Ao longo do último mês, observamos diversas entidades ou mesmo pessoas comuns manifestando apoio ao Setembro Amarelo, campanha brasileira de prevenção ao suicídio iniciada em 2015. É uma iniciativa do Centro de Valorização da Vida, do Conselho Federal de Medicina e da Associação Brasileira de Psiquiatria para conscientizar as pessoas acerca dos motivos – entre eles a depressão – que podem levar as pessoas a tirar a própria vida. Nesse debate, entra também a preocupação com a saúde mental dos adolescentes e jovens, cada vez mais vítimas sensíveis de uma sociedade expositiva, cruel e julgadora, tal qual observamos na trama de Azzi, onde a personagem Luana (Eduarda Fernandes) se vê envolvida numa situação delicada e constrangedora.

O filme começa mostrando o cotidiano de Luana como mais uma jovem comum na multidão de adolescentes de uma escola pública local, ambientada na periferia de Belo Horizonte. Dentre a diversidade dos colegas, logo se destaca na paisagem a misteriosa Emília (Ana Clara Ligeiro), aluna nova na escola, cujo ar andrógino e alternativo desperta o interesse de Luana, que se aproxima de Emília e dá início a uma amizade “colorida”, marcada pela experimentação. Emília, jovem de classe média alta, apresenta Luana a uma realidade muito diferente da sua, marcada por festas, liberação sexual e uso de entorpecentes, o que faz com que a menina fique cada vez mais seduzida por essa nova relação.

Apesar das atuações meia-bomba, as cenas que envolvem as duas meninas trazem a maior parte do conteúdo interessante do longa, que explora de maneira naturalista, por assim dizer, as sensações novas experimentadas por Luana seja na questão da sexualidade seja na temática da insegurança e das incertezas de adolescente, com foco no tema da descoberta e aventura juvenis. É importante mencionar aqui a escolha por uma narrativa quase documental, com o ponto de vista da câmera grudado na personagem principal, para aproximar o expectador do que é vivido pela menina. O silêncio também é uma estratégia narrativa adotada, deixando muitos momentos para serem livremente interpretados por quem assiste.

Em determinado momento da trama, vemos Luana se tornar Luna, seu alter-ego virtual, o que vai amarrar os acontecimentos do segundo ato do longa e nos encaminhar para o desfecho, que se mostra bastante interessante. Embora Luna não seja um filme convencional e por vários momentos a história pareça se perder em algo sem sentido e confuso, meio carregado de imagens abstratas demais – quase como um desses quadros pós-modernos que nos fazem pensar que diabos o seu autor quis expressar ali – algumas cenas específicas foram bem construídas. Destaco duas em especial, a primeira onde a menina Luana contracena com o pai de Emília – há uma tensão tão bem construída aqui que quase me fez sair da sessão, com medo do que poderia assistir em seguida – e a segunda onde ela contracena com sua mãe, já nas sequências finais do longa.

Contando com um final alternativo e, até certo ponto, surpreendente, o filme de Cris Azzi se mostra atual e pertinente, embora não empolgante e certamente não bem sucedido em termos de atuação e montagem. A fotografia é razoável e o tom naturalista pode incomodar em alguns momentos, mas o contexto final é um bom incentivo à resistência e representatividade.

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