Top 10 – Melhores Filmes de 2019
É uma tradição nossa a publicação de algumas listas no início de cada ano: um garimpão com grandes obras ignoradas do ano, as obras que receberam a melhor avaliação e as de pior avaliação (que costuma ter mais visualizações do que a anterior, o que ilustra o apetite pela destruição que cada um de vocês tem) do MetaFictions no ano que se passou, bem como o nosso Top 10 dos melhores filmes do ano. Este último top acontece com uma votação feita pelos colaboradores do site, cada um apresentando seus 10 filmes favoritos no ano. Cabe aqui dizer que, na mente “brilhante” de nosso Big Boss Chefia Guguito Guddu, podem ser votados, única e exclusivamente, as obras cuja estréia no Brasil tenha se dado entre 1º de janeiro e 31 de dezembro. Isso causa uma leve confusão e motivo pelo qual eu reclamo ano sim, ano também, mas sou – como uma outra tradição entre nós – ignorado arbitrariamente.
Seria muito capaz surgir uma obra que estreou no início do ano, mas que foi produzida no anterior (como diversos indicados no Oscar passado). Ou ficando de fora tantas outras, produzidas em 2019, mas que não deram as caras por aqui ainda (como o caso do super bem falado “1917”). Por falta de votos, por exemplo, não tivemos em nossa lista o vencedor da Palma de Ouro de 2018 (“Assunto de Família” ficou na 12ª colocação – uma pena!) e o atual vencedor do prêmio francês (este, certamente, obviamente, obrigatoriamente, marcou presença e ai dessa galera aqui se não marcasse!). Por estas possíveis confusões, sempre peço uma periodização menos matemática e mais mercadológica. Mas, na tradição supracitada, voto vencido ad aeternum.

Do grande apanhado do ano, entre os 10 votantes, e portanto 100 possíveis títulos a serem eleitos, 46 filmes foram citados. Os que mais apareceram foram dois, presentes em 7 listas dos 10 participantes. Das obras aqui eleitas, 4 são originais Netflix, mostrando o quanto o streaming se mantém em forma e segue constante em suas produções. Se, por um lado, falei que foi um ano de altos e baixos, por outro tivemos (em resenha minha) a segunda claquete de ouro do site, nota reservada para filmes que superam a nota máxima de cinco claquetes; obras que são para além do impecável; obras que são perfeitas; obras que são primas de fato! Não é todo ano – ou, na verdade, quase nunca – que se tem a magia de se estar de frente para uma obra-prima no sentido mais puro que o conceito possa trazer. E, para mim, este foi um. Para outros, nem tanto. Mas o “jogo democrático” (como gostam de falar por aí) pede isso.
Eu, uma outra vez no meu foro íntimo, tenho minha faceta autoritária se remexendo dentro da minha obrigatória jaula fina de democracia quando vejo algumas “judarias” expressas em um Top como este. Assim como você, caro leitor, também sou um hater em potencial. Mas as minhas discussões devem se manter privadas. Já você tem todo o nosso convite a se colocar da maneira pela qual desejar, após consideração do Top 10 – Melhores Filmes de 2019 definido coletivamente aqui. Portanto, passe seus olhos por cada título, por cada posição. Mas jamais, em tempo algum, deixe de nos dar seu parecer definitivo sobre o que acontece aqui.
“A democracia é a tirania dos desinformados” (Drácula, Netflix). Liberte seu monstro!
10º – Velvet Buzzsaw, dirigido por Dan Gilroy
Fui ver Velvet Buzzsaw sem quase expectativa alguma. Dirigido por um cara que havia roteirizado coisas tão díspares quanto os clássicos-merdas “Freejack” e “Uma Loira em Apuros”, além dos excelentes “Kong” e “O Abutre” (que ele também dirigiu), eu realmente não sabia o que esperar. Qual não foi minha surpresa ao encontrar uma alegoria que beira a perfeição para o nojo mercadológico que é o que se chama de arte hoje em dia, com artistas sendo medidos somente oela sua viabilidade enquanto produto, com um absoluto descaso de que a Arte, a boa Arte, não é feita para mim ou para você, é tão somente a expressão pessoal do artista. Tudo aqui começa de forma real, nesse mesmo universo em que eu e você vivemos, mas gradualmente o filme, que se mostrava uma tragicomédia, vai assumindo tons de thriller e terror fantasioso, levando-nos cada vez mais pra dentro de um turbilhão surrealista de assassinatos. As perguntas levantadas pelo longa são de uma pertinência que dói na carne, principalmente daqueles entre nós que entendem que a vida não existe sem arte.
Por Gustavo David
9º – Era uma Vez… em Hollywood (Once Upon a Time in Hollywood), dirigido por Quentin Tarantino
Eu prezo amor e honestidade. Simplesmente me encanta quando um diretor, por meio de seus diálogos, cenas e situações, me ensina algo a respeito de si próprio. Tarantino é um dos diretores mais honestos e amorosos que o cinema tem a oferecer hoje e Era Uma Vez em… Hollywood é uma prova disso. O diretor/roteirista expressa, com seus cativantes personagens e seus momentos memoráveis, todo o seu amor pelo Cinema e, principalmente, pelo fazer Cinema. Não faltam momentos escatológicos com a violência extrema e a refinada comédia características dele, mas o que me encanta nos filmes de Tarantino são os momentos de personagem e o que eles trazem. Esse filme, além de uma ode ao Cinema e todo o poder que isso traz consigo, é uma afirmação de amizade, lealdade e companheirismo. Para mim, isso vale muito. O que o diretor trouxe em seu nono filme foi um atestado de respeito imenso ao trabalho de pessoas que já fizeram Cinema. Tarantino não é momentâneo, longe disso, ele é feito de cenas, diálogos e momentos que desafiam o tempo e podem alcançar qualquer um. Tarantino é para sempre!
Por Gabriel Eskenazi
8º – Dois Papas (Two Popes), dirigido por Fernando Meirelles
Fernando Meirelles nos apresenta um acontecimento único na história moderna: a mudança no papado por uma abdicação. Sendo conduzido pelas espetaculares atuações de Anthony Hopkins, interpretando o conservador Papa Bento XVI, e Jonathan Pryce, dando vida ao carismático e progressista Papa Francisco, o longa coloca em cheque questões fundamentais – e atuais – da importância e influência que a Igreja Católica Apostólica Romana tem em seus mais de 1 bilhão de fiéis. Dois Papas é um longa que não romantiza ou esconde falhas humanas de homens que representam uma instituição que luta para permanecer viva em tempos onde a fé real vive sob o eclipse de instituições financeiras.
Por Ryan Fields
7º – A Vida Invisível, dirigido por Karim Aïnouz
Deve-se ir ao cinema com os próprios olhos, mas durante o filme ter a chance de ver o mundo por outras lentes como quem usa óculos pela primeira vez. Por vezes, essa experiência pode ser confusa ou intensa, como quem usa óculos fortes demais; por outras, ela não parece mudar muita coisa até você sair da sala e tirar o par de óculos imaginário. Mas existe um outro tipo de situação que é mais rara. É aquela em que você senta na cadeira e seus olhos são arrancados e substituídos por outros. Não há lentes à sua frente; há vida sendo contada em forma de Cinema, e, num tropeço, você não é mais você. Não há outra forma de tentar descrever a sensação que assistir A Vida Invisível traz ao indivíduo. Em especial à nós, mulheres, ao testemunhar os encontros temporais e pontos atemporais vividos pelas personagens. O filme é a história de tantas avós país a fora, mesmo que só um pouco. Mas é também a história de ser mulher, ainda que em 2019, na medida em que traz papéis que ainda são esperados de nós: submissão, amor incondicional, docilidade, abdicação de qualquer coisa pelo outro. A Vida Invisível arrancou-me os olhos e, enquanto eu voltava pra mim, encontrei tantas outras mulheres que perdi as contas.
Por Larissa Moreno
6º – Rocketman, dirigido por Dexter Fletcher
Em uma década marcada por biografias de grandes figuras, Rocketman foi a mais memorável de 2019. O musical retrata a vida conturbada do cantor e lenda viva Sir Elton John, interpretado de forma magistral por Taron Egerton. Com números musicais extremamente bem conduzidos e uma trilha sonora formada por alguns dos maiores sucessos do moço e de seu letrista/melhor amigo Bernie Taupin (o carismático Jamie Bell), acompanhamos os altos e baixos da vida e carreira desse patrimônio. Vencedor de 2 Globos de Ouro e dirigido por Dexter Fletcher, este surreal espetáculo se tornou um dos favoritos das premiações e do ano como um todo.
Por Valentina Schmidt
5º – O Irlandês (The Irishman), dirigido por Martin Scorsese
O Irlandês é o tipo de cinema que se autorreferencia sem soar pedante, que tem um propósito claro de homenagear seus protagonistas e personagens sem que para isso abdique de uma excelente história. É alta qualidade em todos os aspectos em que a arte do Cinema se escora (até mesmo efeitos especiais, pasmem!). Já vimos times dos sonhos falharem em tudo que é atividade humana, mas dessa zica o mestre Scorcese não padece. Ele escolheu os melhores e os melhores entregam o melhor. É um deleite. É imperdível. Ah, e faça um favor a si mesmo(a), não reclame das três horas e meia. Desligue seu celular e você verá que te sobrará tempo para assistir à essa obra magnífica.
Por Rodrigo Cirne
4º – Bacurau, dirigido por Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles
Bacurau vem como resposta a um senso comum que diz que o brasileiro é indiferente ao caos no próprio país ou que, ainda, contribui mesmo é para ele alastrar. Um soco na cara de quem diz essas asneiras. De que brasileiro você tá falando? Talvez essa seja a pintura do sul ou sudeste. Mas pise no nordeste e sinta a energia de um povo que tem consciência de classe a seu próprio modo pra dar e vender, pra compensar as terras curitibanas, por exemplo. E de que precisa ser livrado do estereótipo de gado, fruto de uma imagem coronelista. A essa altura não acredito que Bacurau tenha continuado místico a ponto de ter de me preocupar com palavras aqui ao descrevê-lo, temendo estragar a experiência de assisti-lo. De maneira breve, é possível dizer que o filme passeia por conceitos complexos como colorismo, inclui debates acerca da diversidade sexual e de gênero e entrega tudo isso dentro de uma história de cangaço distópico, reforçando a convocação que faz à valorização do nacional. Uma obra que atesta que a violência é uma ferramenta poderosa no Cinema quando o roteiro é também poderoso. E sim, Tarantino, que está certamente lendo o artigo: essa foi pra você.
Por Larissa Moreno
3º – Coringa, dirigido por Todd Phillips
O que é necessário para transformar uma boa pessoa em um monstro? Quão distantes estamos nós – ditos “normais” – de nos tornarmos loucos assassinos? Não muito, é o que nos mostra Coringa, filme que vem narrar a origem do vilão do Batman, mas que faz muito mais do que isso. Mostra de forma assustadora como a sociedade pode impiedosamente quebrar um ser humano, por maior que seja sua luta pela sanidade, por mais que tente encontrar alguma alegria nesse mundo miserável, por mais que se esforce para se manter bom. Esse Coringa, interpretado magistralmente por Joaquin Phoenix, trouxe tanto temor porque, apesar de uma ou outra tentativa de o roteiro criar uma separação didática entre o “normal” e o “insano”, ele se coloca como espelho, como um alerta que diz “eu poderia ter sido você”. Assusta porque é verdade. Mais do que assustar, o filme nos machuca pois não permite que sintamos raiva de um vilão. Não há catarse ou redenção aqui. Sente-se tristeza, angústia por vermos uma pessoa tão absolutamente agredida em cada momento de sua vida a ponto de que nada lhe restea além de agredir de volta. Não há como terminar o filme sem se perguntar: “E se fosse eu? Faria diferente?”.
Por Vlamir Marques
2º – História de um Casamento (Marriage Story), dirigido por Noah Baumbach
Poucos são os filmes que conseguem ser marcantes utilizando-se de temas ordinários, filtrando e peneirando o máximo possível da técnica cinematográfica e investindo para além de tudo nas sensações mais íntimas de seus personagens. Tratando do divórcio de um casal com um filho pequeno, Noah Baumbach desnuda os conflitos triviais que todo relacionamento, em algum tempo, conhece (mesmo aqueles que resistiram). O comum, o simples, o cotidiano aqui se faz mais impactante pela naturalidade como o filme é fotografado, dirigido e atuado. Ao longo da exibição, cada espectador vai se vendo nas expressões sutis de Adam Driver e de Scarlett Johansson. Ao longo da exibição, cada espectador vai se reconhecendo em um momento ou outro; seja em um julgamento pueril por uma cena familiar, seja no retorno emocional em outra sequência igualmente similar à sua experiência individual. E a relação que a obra propõe ao seu público é tão íntima que somos tragados pelo tufão de sentimentos que afogam, um a um, seus personagens principais. À imagem e semelhança de um Cinema-Verdade, o feito de Baumbach é memorável, é denso, é poderoso.
Por Rene Michel Vettori
1º – Parasita (Gisaengchung), dirigido por Joon-Ho Bong
E o topo da nossa lista dos melhores filmes de 2019 é ocupado por uma obra-prima. Parasita, do sul-coreano Bong Joon-ho, é uma daquelas produções que aparecem de tempos em tempos para nos lembrar porque o Cinema é uma das maiores realizações da humanidade. Impecável em cada um de seus aspectos, a obra é simplesmente inclassificável, desafia qualquer possibilidade de fechá-la em um gênero. Tragicomédia? Drama? Reflexão social? Filme político? Banho de sangue? Suspense? Crime? Horror? Tudo isso e mais muita coisa. Parasita é, acima de tudo, um tapa na cara (divertidíssimo e cruel) de um mundo que, assentado em desigualdades, desumanizou o homem. A tragédia clássica e a comédia de erros de duas famílias coreanas, uma miserável e outra podre de rica, são alegorias de um tempo que levou qualquer limite ao mais inconcebível dos extremos. Parasita é obrigatório. E prova que, como bem disse o seu diretor ao receber seu Globo de Ouro (e seu Oscar está a caminho): “uma vez superada a barreira das legendas (e, no caso de nós brazucas, a barreira de sons diferentes do inglês ou do português), vocês conhecerão muitos filmes incríveis”.
Por Marco Medeiros
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