Crítica: Não Fale com Estranhos (The Stranger) - 1a Temporada
“Será que o ser humano é realmente capaz de fazer uma coisa dessas ?”, “não, ele/ela não seria capaz de fazer isso” foi o que passou pela minha cabeça em certos momentos dos 8 episódios de Não Fale com Estranhos. Mais do que focar nos segredos revelados que causam transtornos nas vidas das pessoas, o que realmente nos prende à narrativa são as reações em cadeia dos personagens diante das informações até então desconhecidas. O argumento da nova produção britânica da Netflix é baseado num livro com o mesmo título escrito por Harlan Coben que também é um dos produtores executivos da minissérie. Devo dizer, apesar da discreta divulgação, vale a pena apreciá-la. Confesso, algumas atuações são surpreendentes e não há nada de raso no thriller, muitas camadas vão surgindo conforme os conflitos são explorados desencadeando na profundidade da história. Na tal colcha de retalhos, todos os fatos se conectam e até a escolha da palheta de cores dos figurinos e cenário despertam o real interesse do espectador.
Pois bem, estamos diante de uma família daquelas de comercial de margarina. Um casal bonito de se ver, Adam Price (Richard Armitage) e Corinne (Dervla Kirwan) se conhecerem ainda muito jovens, permaneceram apaixonados desde então. Ele, um advogado bem sucedido, e ela, uma professora reconhecida e amada por todos na escola e na vizinhança. Além disso, eles têm dois filhos lindos que têm uma relação de confiança e bastante afeto com os pais. O mais velho é o melhor jogador de futebol do time da escola e o mais novo é a criança mais fofa do pedaço. Parece tão perfeito, não é mesmo? Até que um belo dia,uma estranha (Hanna John-Kamen) surge do nada e conta a Adam que sua mulher fingiu a última gravidez e pior, fingiu perder o bebê também. What? Adam não quer acreditar, mas começa um processo de investigação e é aquela famosa história de “quem procura, acha.” A partir daí outros segredos bizarros vêm à tona. A relação conjugal desequilibra de tal forma que seu fim da parece ter chegado. A cada episódio a estranha que atua como uma espécie de vingadora ou julgadora de pecados, entra na vida de alguém diferente com evidências de um novo acontecimento escondido no passado obrigando a pessoa a tomar uma decisão que, obviamente, vai colocar em xeque o caráter do ser humano e a gente assiste de camarote tudo desmoronar. O espectador vai ficando vidrado e ao mesmo tempo bastante desconfortável com o desencadear das péssimas escolhas feitas (opa, julguei) pelas personagens. Não estamos falando de um segredo normal, (mas, afinal, o que seria um segredo normal?), são segredos que facilmente se confundem com mentiras e podem acarretar perdas irreparáveis.
A sensação latente em nós oscila entre “agora sim estamos de frente a uma família problemática normal” e “meu Deus, ou essa pessoa estava muito desesperada ou é louca mesmo”. Será? Desconfio que estamos diante do nosso espelho. Não posso me estender em detalhes a fim de não dar spoilers, mas Não Fale com Estranhos tem um quê de Black Mirror e me parece que seu principal objetivo é salientar a capacidade do ser humano de viver ou causar situações absurdas e continuar vivendo como se elas fossem normais em prol de algo maior, que só satisfaz o próprio interesse de alguém. É uma abordagem bem completa de vários temas como maternidade, fidelidade e machismo dentro de uma sociedade londrina, porém, poderia ser brasileira ou peruana, enfim. Mesmo que você siga o conselho da sua mãe e não fale com estranhos, vale a pena maratonar a série. Os episódios de 40 e poucos minutos fluem e em 6 horas você toma um choque de realidade no sofá da sua casa comendo pipoca. Que tal?
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