Crítica: O Silêncio do Pântano (El Silencio del Pantano)
Como não foi possível mergulhar de cabeça naquela lama e aspirar toda a água necessária para que os meus pulmões parassem de funcionar e me livrassem de vez desta tortura, sigo vivo, com menos uma hora e meia de vida, disposto a tentar colocar em palavras o que foi O Silêncio do Pântano.
O personagem central da trama, identificado apenas como Q (Pedro Alonso, o hypado Berlim de La Casa de Papel), é um misterioso romancista do crime que, ao imergir em sua obra mais recente com base em um complexo esquema de corrupção e lavagem de dinheiro, nos dá a entender que os assassinatos ocorridos no livro, na realidade, são homicídios cometidos pelo próprio autor, sendo esta a inovadora sacada do filme.
Em um dos momentos iniciais, Q é abordado por uma leitora durante uma sessão de autógrafos e é questionado sobre o porquê de seu personagem matar as pessoas e quais são as suas verdadeiras motivações por trás de cada morte. A resposta é curta e grossa: “Porque ele pode”.
Mastigada a dupla jornada do personagem, o roteiro falha miseravelmente ao tentar brincar com essa linha tênue entre realidade e ficção, através de meios de execução pavorosos. Desde o primeiro crime não há qualquer estímulo ao interesse do espectador. A culpa é toda do ritmo da narrativa. A sensação é a mesma de assistir a um episódio aleatório de uma série muito ruim. Quase nada se conecta. Os personagens surgem e somem à esmo. O pano de fundo do esquema de corrupção não tem qualquer aprofundamento.
Quando a lista de vítimas de Q se volta para um dos corruptos do alto escalão do governo espanhol, o protagonista se vê perseguido por uma operação lava-jato da vida, cuspida no meio da história na esperança de servir como ponte para um longo cardápio de metáforas banais com o pântano, o lodo e as abelhas, moscas, mosquitos ou seja lá quem for o dono daqueles zumbidos.
Em dado momento, a direção manipula as nossas sensações como se nos últimos instantes do filme algo fosse ser desmembrado ou desvendado. Há um festival de planos longos que em nada ajudam na narrativa ou sequer na construção estética. Cada ambiente, cada corte parece receber uma importância que não tem qualquer fundamento.
Pra fechar com chave de ouro, a cena final é a mais manjada possível. O barulho da impressora funcionando é o último sussurro desesperado do diretor Marc Vigil implorando para que você se contente com a discussão realidade vs ficção, dentro da exaustiva premissa do “ele estava narrando a história ou isso tudo aconteceu?”.
O filme mira em uma proposta e acerta na nossa cabeça. Até as críticas sociais potencialmente apreciáveis são jogadas dentro da privada.
Sabe aquela época de colégio em que você chegava para a aula de 07:30h e descobria que esqueceu de fazer o dever de casa da aula de 08:30h? Então, o título do trabalho que deu para ser entregue é O Silêncio do Pântano.
Leave a Comment