Crítica: Betaal
Antes de mais nada, eu me sinto na obrigação de confessar que o tesão por zumbis nunca foi um fetiche que me fisgou. No auge do meu ócio, eu segui incapaz de dar play em obras como “Walking Dead”, “Resident Evil” ou “Zumbilândia”, então a análise nada técnica deste lançamento vai ser feita com doses ainda mais cavalares de cagação de regra e antipatia.
Pois bem. A ligeiríssima primeira temporada de Betaal, série indiana de terror original Netflix, busca construir algumas pontes entre as crenças de seus povos e um cenário histórico de independência, contextualizando as suas desigualdades ainda latentes por meio de uma abordagem com críticas sociais implícitas.
Numa pequena aldeia localizada ao lado da Montanha Betaal, a população nativa supostamente garante a manutenção de uma divindade perigosa enclausurada em um túnel. Quando o governo ordena à Surya Construction que desenvolva uma via expressa nesta região, toda a problemática do roteiro está montada.
Ajay Mudhalvan (Jitendra Joshi), o empreiteiro ganancioso, contrata uma espécie de Bope indiano para fazer a limpa no local e, inexplicavelmente, leva a sua esposa e filha nesta missão. Os moradores tentam impedir a reabertura da passagem construída pelos britânicos durante a guerra, mas depois de um clássico banho de sangue, a antiga maldição acaba sendo invocada.
Descobre-se então que o antigo coronel inglês Lynedoch (Richard Dillane) e os seus soldados haviam sido enterrados vivos no túnel e agora estariam dispostos a reconquistar a Índia. É a partir deste momento que a equipe de elite contratada para evacuar o local passa a ter protagonismo na trama, encabeçados pela comandante Tyagi (Suchitra Pillai) e pelo seu subordinado Sirohi (Vineet Kiinumar), aquele clássico personagem de herói que precisa se redimir de seus pecados do passado.
Revestido da minha petulância ocidental, arrisco a dizer que todo o quadro histórico abordado até então serve como mero pretexto do roteiro para dar o aval que a direção precisa para imergir aos elementos mais bregas do terror, com direito a muito sangue espirrando, cabeça girando, faca no pescoço, fotografia quase toda no escuro e sustinhos barulhentos. É exatamente aí que o caldo entorna. A evolução da história me pareceu extremamente confusa e forçada, sem que fosse possível alcançar um suspense de zumbis, e que tampouco gerou a tensão necessária em detrimento das nuances de espiritualidade e possessão.
Ao que me consta, os zumbis geralmente são retratados como seres mortos-vivos, o que não deveria ter relação com aqueles soldados de infantaria possuídos pelo coronel endiabrado, funcionando como meros fantoches. Não vou nem gastar saliva com a composição terrível das criaturas. Uns canibais esquisitos com dentes de vampiro e olhos vermelhos brilhantes diretamente de quatro décadas atrás.
Assim como os encapetados, os outros personagens da série também são facilmente manipulados, não possuem profundidade e estão presentes apenas para vincular um conjunto básico de instruções sem qualquer tipo de peculiaridade nos diálogos.
A composição em quatro episódios não é o maior dos defeitos da série, mas torna inevitável o questionamento: “essa porra não poderia ter tido o formato de longa?”. Caso de fato haja uma segunda temporada, conforme o último episódio tenta sugerir, será interessante ver em que direção o roteiro seguirá e se conseguirá reverter o dano causado pela preguiça de seus idealizadores. Há algum potencial escondido nas questões mais folclóricas da trama.
Como mais vale um passarinho na mão do que dois voando, para evitar qualquer tragédia, eu deixaria Betaal presa dentro do túnel.
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