Crítica: Santana
Antes de questionarmos a qualidade de mais um longa de ação exageradamente preocupado em forçar situações de confronto ao invés de estruturar um roteiro capaz de nos proporcionar a tensão de maneira natural, Santana, primeiro filme angolano a ser disponibilizado na plataforma da Netflix, traz um caráter pioneiro que agrega valor à obra.
Dirigido por Maradona Dias dos Santos & Chris Roland, a obra já começa revestida de uma representatividade necessária que pode abrir espaço para que outras narrativas, além do eixo ocidental, sejam mais comumente consumidas por um espectador desinteressado em maiores problematizações. No dia em que dar play em um filme africano, por si só, for algo comum e não significar muita coisa além da busca pelo entretenimento, poderemos mudar a altura do sarrafo.
Beleza? Show. Pois bem, eu que não sou um consumidor assíduo do gênero, percebi que a qualidade das cenas de ação é um tanto quanto duvidosa e, até certo ponto, mal aproveitada, mas o que mais me incomodou foi a construção rasa dos personagens, que parecem distantes uns dos outros até que são entrelaçados pelo objetivo maior do filme que é a porradaria.
Com o nhenhenhem do “baseado em fatos reais”, Santana conta um pedaço da história de dois irmãos, Dias (Paulo Americano) e Matias (Raul Rosario), um agente da divisão de narcóticos e um general respeitado, que acabam descobrindo a identidade do responsável pelo assassinato de seus pais, há mais de 35 anos, e partem em busca de vingança, cada um da sua maneira.
A partir desta premissa, surge uma história que acaba deixando o seu potencial para escanteio por não construir bem a personalidade dos principais personagens, se mostrando muito mais preocupada em se utilizar dos elementos clichês do cinema padrãozão, abusando de uma montagem pouco criativa e um tanto quanto desinteressante, em cenas longas e pouco amarradas.
Eu também me atrevo a dizer que é impossível assistir ao filme sem se incomodar com a mistura de idiomas totalmente despropositada que se vê em cena, o que já se tornou uma tradição da Netflix. Os diálogos que são passados na Angola ou na África do Sul, são violentados por trechos em inglês a cada meia dúzia de frases no português local. Parece aquele povo chato de colégio bilíngue que resolve “raciocinar” americanizando ao invés de conversar fingindo ser um ser humano normal. Um porre!
Eu não sei se o roteiro conseguiu exigir o nível de desatenção necessário para que as tentativas de reviravoltas pudessem fazer efeito na cabeça de alguém, mas a falta de vigor dos atores e a sempre exaustiva sexualização das personagens femininas, dentre elas, a estrela angolana Neide Van-Dúnem, me deram a receita do bolo muito antes da consumação desses plot twists frustrados a medida em que os longos 106 minutos de filme iam chegando ao final.
Entre a violência gráfica clichê, as batidas de carro tragicômicas, os chefões falando grosso no escuro, os policiais super-homens, os bumbuns de fora e os defeitos especiais, eu confesso que não vejo Santana numa prateleira muito inferior a outros filmes do gênero. Se você dá play em qualquer coisa que o algoritmo do streaming te indica, vale a pena prestigiar esse filme angolano, que tenta brincar de Hollywood, mesmo com uma cotação muito diferente dos Velozes e Furiosos da vida.
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