Crítica: Malcolm & Marie
Cá estamos com mais um longa que é sustentado única e exclusivamente pela atuação de dois atores em conversas que (tentam) ser magnéticas, em uma relação que parece apontar para o fim. Exemplos recentes disso não nos faltam, indo desde “História de um Casamento” até “Um Limite entre Nós“. Numa espiral de “trocação” de insultos, meias verdades e manipulação, Malcolm & Marie chega à Netflix nesse final de semana e tenta te botar numa situação na qual você não deve meter a colher. Mas será que ficamos só nisso mesmo?
O filme parece ser uma puta lavagem de roupa suja do início ao fim, mas ele aponta para algo muito mais profundo em diversos momentos, apresentando algumas camadas que são lentamente descascadas e mostrando um interior bem mais complexo. Iniciamos com Malcolm e Marie chegando a sua casa após a estreia do filme que ele dirigiu – o melhor até então de sua carreira – em plena madrugada. Eis que, num comentário ordinário, começam pequenos questionamentos sobre a noite em questão, que rumam na direção do uso de drogas, originalidade, militância, machismo e racismo. E embora o cenário armado seja interessante, ele resvala sem muita profundidade nos temas supracitados. Tudo o que um artista preto faz é militância? Tudo é a visão étnica do oprimido? Existe originalidade além de sua própria experiência? Ajudar um (ex)viciado te dá o direito de diminuí-lo ou deixá-lo em dívida? Mesmo eu tendo minha opinião pessoal sobre todas essas questões, ficamos sem muita reflexão sobre o tema, que são abandonados rapidamente para iniciar outro tema sem nem dar tempo daquele assentar.
Mesma a discussão sendo crível – e eu me peguei concordante com cabeça com as situações apresentadas em diversos momentos – ficamos presos num looping no qual o objetivo não é vencer o argumento, mas, sim, apenas machucar e diminuir o outro, tornando maçante o filme logo na 3a vez que isso ocorre. Contudo, há um mérito aqui no que tange a algo muita em voga na sociedade atualmente (vide BBB): o que é mais importante? O que é dito ou quem diz? Ou um precisa estar em concordância com o outro? A cor da pele importa mais do que a essência do que é dito? A cor da pele dá forma aquilo que é falado? E o gênero? E a sua vivência? A verdade é subjetiva e fica aos olhos de quem interpreta perante quem fala e cada um que assistir ao longa tirará conclusões diferentes, o que traz beleza ao filme de Sam Levinson (que é branco).
Sam Levinson por sua vez, diferente do que faz nos bons “País da Violência” e “Euforia”, não conduz muito bem as cenas, tornando pouco crível a forma que os assuntos são tratados, especialmente levando em consideração o tempo que se demorou para o filme de Malcolm ficar pronto. Sério que você espera estrear para perguntar por que não estava no elenco? E falando no elenco, enquanto assistia já pensava em como falar da destoante atuação de Zendaya (que fez parceria com Sam Lavinson em “Euforia”) perante John David Washington, que carrega a maior parte do filme nas costas, até chegar ao seu quarto final e esse “destoante” virar um senhor “estonteante”, com um monólogo de cair o cu da bunda de tão honesto e esculachante que foi.
No mais, Malcolm & Marie apresenta uma belíssima fotografia preta e branca granulada com uma iluminação que não é pretensiosa como a de “Mank” (embora boa ainda assim), mas, sim, moderna, com muito contraste e brancos estourados. E não me leve mal, contanto que você não pense muito nas questões levantadas em si e busque o macro, essa obra merece a sua atenção e apreciação.
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