Crítica: Passageiro Acidental (Stowaway)
Começo esse nosso papo pedindo para que você contemple dois Tops 10 feitos no início do site, o Top 10 Ficção Científica e Top 10 Aliens. Você perceberá que a galera aqui do site gosta mesmo de temas fantásticos que só a ficção científica permite, mas não só isso. Gostamos desse gênero especialmente quando ele nos permite explorar a natureza e a condição humana, indo desde a definição do que é ser humano, passando por questões éticas e morais e chegando ao comportamento em sociedade, usando alegorias para discutir o agora. É nesse contexto que chega à Netflix Passageiro Acidental.
Contudo, diferente dos filmes nos tops acima, que são um primor de narrativa e que dentro de uma licença poética conseguem entregar ambientes/situações críveis, nosso estreante do final de semana peca com certa frequência nesse âmbito. São cenários pobres, leis da física fundamentais sendo violadas (sim, sou um realista seletivo e se você entende de força centrífuga você sabe do que estou falando) e situações que seriam aceitáveis num barco de passageiros, mas que ocorrendo numa nave indo para Marte seriam de improváveis a impossíveis. São muitos elementos roubando a imersão, mas ainda assim o cenário montado cria a possibilidade de discutir um tema muito em voga: o dos refugiados.
Michael Adams (Shamier Anderson) fica inconsciente durante a preparação da nave Hyperion e é lançado junto com a pequena tripulação de 3 membros rumo ao planeta vermelho. Com a descoberta dele e de um dano irreparável num equipamento vital (que incrivelmente não tem um reserva), ficamos na situação de muita gente para pouco recurso, significando que o passageiro extra compromete a sobrevivência de todos. Adams é negro e vive uma situação precária junto com sua irmã, enquanto todos os outros astronautas são de famílias bem estabelecidas. Muitos discursos e simbolismo completam um quadro que coloca Adams numa posição desprivilegiada, como não viver nos alojamentos, mas numa área de carga, realizar qualquer tipo de tarefa simples para ser um membro produtivo, ser o alvo dos dedos apontados quando os recursos ficam escassos, corroborando o velho discurso xenófobo dos migrantes sobrecarregarem o sistema e que, portanto, deveriam ser extraditados, dentre outros eventos.
É aqui que o filme – que tecnicamente já não chega muito firme – começa a se embolar nas próprias pernas. Embora todo o cenário construído seja tenso, as resoluções tentadas não dialogam muito com o que foi apresentado até então, criando uma enorme desconexão, além de um discurso – que eu não sei se foi uma súplica ou sátira – que pouco joga com a realidade ou com próprio longa. Talvez parte desse problema recaia no elenco. Com a exceção da Toni Collete, o elenco como um todo não me vendeu a ideia da sua capacidade técnica. Era gente histérica, gente que não sabia fazer seu trabalho, a equipe da missão na Terra que nunca tinha resposta pra nada e por aí vai.
Ficamos então com um final que não deve agradar nem gregos nem troianos, mas que dialoga com o filme como um todo, que também não sabe muito bem o que quer. Não que Passageiro Acidental seja um filme ruim, mas ele carece dos elementos que fazem uma ficção científica boa: ser crível ao mesmo tempo que fantasioso e real.
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